O pior do rodoviarismo é a narrativa

Por Diego Vieira Rolim dos Santos | 09/01/2017 | 3 min.

Legenda: Estação Rio Grande da Serra
Tóxica e enganosa, ela se faz presente quando menos esperamos, nos jornais, nas mesas de bares, nos corredores do trabalho, na cantina da faculdade

O Diário do Grande ABC publicou hoje, 09/01/2017, uma reportagem intitulada “Avenida dos Estados e seus velhos problemas”, da qual os dois fragmentos abaixo foram extraídos:

Principal ligação entre o Grande ABC e a Capital, passando por três cidades da região — Santo André, São Caetano e Mauá — a via segue com deficiências estruturais, entre elas remendos malfeitos no asfalto, falta de sinalização viária adequada, vegetação alta em diversos trechos, erosão às margens do Rio Tamanduateí, além dos já tradicionais congestionamentos.

(…)

A via, que recebe fluxo diário de 130 mil veículos, também tem imposto dificuldades aos pedestres e ciclistas que circulam por seu trajeto.

Só por curiosidade, vamos olhar a quantidade de passageiros que são transportados em média pela Linha 10-Turquesa da CPTM (Brás-Rio Grande da Serra), que além de atender Santo André, São Caetano e Mauá, também atende Ribeirão Pires e Rio Grande da Serra: 364,8 mil, conforme dados da CPTM, que opera o Trem Metropolitano.

Não é curioso o jornal tentar fomentar uma espécie de esforço regional a favor da Avenida dos Estados, mas nunca esboçar reação parecida com relação à Linha 10, falando apenas de problemas pontuais?

Eis aí a toxicidade da narrativa rodoviarista, que faz parecer normal tratar uma via que movimenta cerca de 35,6% do que a Linha 10 movimenta — principalmente se tomarmos uma média de 1,38 passageiros por automóvel (índice registrado na capital paulista em 2014, citado em reportagem do Estadão) — , como se ela realmente fosse a principal ligação entre a capital e o Grande ABC, coisa que não parece ser.

Por que o Diário do Grande ABC não faz uma reportagem sobre os problemas crônicos na Linha 10-Turquesa da CPTM? Aqui vai a dica do tipo de problema enfrentado pelos mais de 300 mil passageiros diariamente: estações velhas e sem acessibilidade, trechos de velocidade reduzida por conta da via precária, falta de sinalização moderna para menores intervalos, trens antigos e inadequados para o perfil de demanda, trechos que alagam com facilidade em dias chuvosos, além de obras abandonadas (pontilhões, subestações de energia etc).

Legenda: 3 estações e 10 minutos de percurso, em poucos horários e com partida a cada 30 minutos. Queremos um expresso de verdade!

Se todos os problemas fossem solucionados, muitos usuários poderiam migrar do transporte individual para o transporte público, diminuindo a dependência dos carros que poluem mais, custam mais caro e são ineficientes. A Linha 10 também poderia ter um serviço verdadeiramente expresso (não o arremedo lançado ano passado), tornando a ligação com a capital rápida e confortável, como deve ser.

Trata-se de uma postura que não é exatamente nova, tanto que também não é a primeira vez que estamos fazendo uma crítica do tipo, por exemplo, em 29/10/2014, foi publicado pelo COMMU um texto intitulado “Dos 180 serviços ao longo das marginais encontrados pela Folha, nenhum tornou relevante a menção da Linha 9 da CPTM”.

A única maneira de romper com o rodoviarismo é erguer a cabeça e não aceitar sua narrativa venenosa.


Colaborações: Caio César (co-autor)



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