Por Caio César | 31/05/2018 | 12 min.
Índice
Introdução
Recentemente recebemos os seguintes comentários na nossa página no Facebook, devidamente indicados com setas vermelhas, após questionarmos quão ineficiente é o automóvel ao ocupar o espaço no sistema viário, ou seja, nas nossas ruas e avenidas:
A ideia de que um carro é obrigatório para viajar e fazer compras não é nova. Durante a implantação das faixas exclusivas de ônibus na gestão do ex-prefeito Fernando Haddad, eram recorrentes as manifestações de comerciantes, que se manifestavam contra as faixas exclusivas e, portanto, contra o aumento da qualidade de vida do passageiro do transporte público em detrimento da racionalização do espaço que, ao ser privatizado em prol de uma minoria, supostamente garante a maior movimentação do comércio varejista de rua. Basicamente os comerciantes faziam parecer que pedestres e ciclistas não compram.
Era uma postura contraditória, tanto pelo resultado positivo que se observou posteriormente com a Paulista Aberta, como pelas reclamações em São Miguel Paulista após o fechamento do edifício original da estação da CPTM, fronteiriço a uma das ruas que compõem o calçadão. Anos se passaram, as faixas exclusivas em sua maioria não foram retiradas e o comércio segue funcionando, a despeito de toda a grita que houve inicialmente.
A partir da experiência descrita acima, propomos aqui destacar que sim, há facilidades quando o transporte coletivo está envolvido nas compras e nas viagens.
Terminais rodoviários e aeroportuários
Com a inauguração da Linha 13-Jade da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos, a malha de trilhos passou a permitir acesso a mais uma rodoviária, no caso, uma das rodoviárias mais subutilizadas da Grande São Paulo, localizada no Parque Cecap, em Guarulhos, sendo assim, estão integrados ao sistema de trilhos: três terminais rodoviários na capital e cinco terminais rodoviários em cidades vizinhas, que também compõem a metrópole. Não surpreendentemente o anúncio a seguir, feito pela Viação Sampaio, destaca a conexão com a Estação Estudantes da CPTM em Mogi das Cruzes:
Para ganhar tempo, hoje o viajante também dispõe de plataformas como o Clickbus, disponível via web e aplicativo para Android e iOS, permitindo a simulação de viagens e a compra de passagens.
Vale salientar que nas rodoviárias da capital, a integração entre o sistema de trilhos e os terminais é bastante sinérgica, garantindo que mesmo intempéries severas não prejudiquem o acesso, já em cidades como Santo André, a passarela suspensa do terminal rodoviário funciona como cobertura para quem sai da Estação Prefeito Saladino.
São as estações com terminais rodoviários: Portuguesa-Tietê (Linha 1-Azul), Jabaquara (Linha 1–Azul), Palmeiras-Barra Funda (Linha 3-Vermelha, Linha 7-Rubi e Linha 8-Diamante), Osasco (Linha 8-Diamante e Linha 9-Esmeralda), Prefeito Saladino (Linha 10-Turquesa), Ribeirão Pires (Linha 10-Turquesa), Estudantes (Linha 11-Coral) e Guarulhos-Cecap (Linha 13-Jade).
Já para quem prefere ou precisa voar, a Estação Aeroporto-Guarulhos da Linha 13-Jade pode ser uma mão na roda. As limitações da conectividade proporcionadas pela concessionária foram discutidas com a devida profundidade no artigo “Por que a nova linha da CPTM para o aeroporto internacional não chega diretamente nos terminais?”, contudo, Cumbica também é acessível por meio do Airport Bus Service da EMTU, com a Linha 257 (veja detalhes na EMTU e rota no Trafi) partindo regularmente do terminal norte da Estação Tatuapé, com tarifa de R$ 6,15 no momento da publicação deste artigo, além de outras linhas de caráter executivo (ônibus rodoviários refrigerados que dispõem de amplo bageiro), com tarifa de R$ 50 no momento da publicação deste artigo. As linhas da EMTU complementam o serviço da CPTM, que no momento se encontra em operação assistida. Os ônibus intermunicipais oferecem hoje horário mais abrangente e poupam o passageiro das transferências, ao preço de uma tarifa mais alta e menor confiabilidade, já que estão sujeitos a congestionamentos.
Viajar com ônibus rodoviários que partem das rodoviárias espalhadas pela metrópole também costuma ser razoavelmente confortável e há viações que oferecem serviço executivo ou leito. Nem todas as linhas longas param em várias cidades. Para situações em que o conforto é dispensável em troca de economia, existe a possibilidade de usar linhas suburbanas da Artesp, mas o trajeto pode demorar bastante. Em 2017 escrevemos um artigo sobre a linha suburbana que liga Itapevi a São Roque.
Comércio de rua e centros comerciais fechados (shopping centers)
Aqui as opções são vastas e cobrem variados perfis de renda. Em geral, diversos bairros de São Paulo possuem algum grau de concentração de comércio e serviços, que pode:
- Estar disposto em um conjunto de ruas e/ou avenidas;
- Estar disposto ao longo de uma avenida, como uma espécie de centralidade linear;
- Estar disposto em áreas que privilegiam o pedestre, como calçadões;
- Estar disposto em um ou mais centros comerciais fechados, como shopping centers ou galerias.
Se um bairro apresenta opções muito limitadas de comércio, geralmente significa que um bairro vizinho abriga uma maior oferta. Por exemplo: a Vila Santa Isabel, na Zona Leste de São Paulo possui poucas opções comerciais, geralmente restritas ao apoio às residências (padarias, açougues e pizzarias), porém, a Vila Carrão e a Vila Formosa, oferecem maior variedade e quantidade, com estabelecimentos dispostos ao longo de avenidas como a Dr. Eduardo Cotching e a Conselheiro Carrão; neste exemplo específico a diversidade de linhas de ônibus e a presença do Terminal Vila Carrão também são elementos facilitadores importantes.
A mesma lógica pode ser aplicada fora de São Paulo, com a vantagem de que as antigas ferrovias orientaram o surgimento e crescimento de cidades, sendo assim, é muito comum na malha da CPTM encontrar presença de comércio e serviços nas estações principais das cidades e, melhor ainda, diversas delas são dotadas de calçadões, como é o caso de Ribeirão Pires, Mogi das Cruzes, Santo André, Mauá e Osasco.
A Cia. do Metropolitano de São Paulo também possui estações integradas a shopping centers, como é o caso de Santa Cruz (Linha 1-Azul), Tucuruvi (Linha 1-Azul), Tatuapé (Linha 3-Vermelha) e Corinthians-Itaquera (Linha 3-Vermelha). Sobressai-se também a Linha 9-Esmeralda da CPTM, que possui estações vizinhas ou próximas a vários centros comerciais, como já comentamos em um artigo crítico à Folha de S.Paulo, dentre os citados naquele artigo, Shopping SP Market, Shopping Eldorado, Shopping Market Place e MorumbiShopping talvez sejam os de acesso mais cômodo.
A Zona Central de São Paulo também privilegia o pedestre e tem ruas consagradas, como é o caso da 25 de Março (Estação São Bento, Linha 1-Azul). Consagrado também é o bairro do Brás, na Zona Leste: destino de milhares de pessoas, chega ao requinte de abrigar estabelecimentos dotados de estacionamentos para ônibus rodoviários e áreas de descanso para seus motoristas (caso da Galeria Pagé Brás e do Vautier Premium). A extensa linha de bloqueios da Estação Brás no acesso à Praça Agente Cícero, evidencia a elevada movimentação de passageiros devido à atividade comercial, voltada principalmente ao comércio atacadista de vestuário. Seria impossível para o bairro do Brás sobreviver sem os ônibus rodoviários, os ônibus urbanos e o sistema metroferroviário, ali o automóvel de passeio não passa de um estranho no ninho.
Mercados e comércio eletrônico
Para muito além do tipo de comércio descrito na seção anterior, as pessoas também procuram mercados de variados tipos e dimensões, com participação cada vez maior do comércio eletrônico. É importante desconstruir a ideia de que apenas hipermercados imensos são os únicos verdadeiramente relevantes, vide o fragmento abaixo, extraído da reportagem “Por que os grandes supermercados estão abrindo lojas express” da VEJA.com:
O formato que mais cresce hoje é o de loja de vizinhança, que passou de 61 para 614 unidades de 2015 para 2016, um salto de 906,56%. Em comum, esse tipo de supermercado tem o tamanho reduzido e um sortimento menor de produtos.
Muito do sucesso dessas lojas de proximidade pode ser explicado pelo controle da inflação, que reduziu o hábito dos consumidores de fazer a compra do mês e estocar produtos em casa.
Fica claro que o modelo dos hipermercados, que beira o rural e era sinônimo de lojas grandes e com estacionamento imenso, está sendo questionado dentro do próprio segmento, por players consolidados, como o Carrefour. Além disso, ainda que a reportagem cite redes como Petit Mambo e Hirota Express, é sabido que São Paulo tem muitos mercadinhos nos bairros, principalmente na periferia, ademais, redes como Dia e Nagumo também costumam ter capilaridade em periferias e praticar preços mais acessíveis.
Feiras livres também continuam sendo uma opção. A capital possui uma quantidade imensa delas e a ferramenta FeiraMaps da prefeitura pode ser utilizada para procurar a feira mais próxima e com funcionamento no dia mais conveniente da semana. Para Grande São Paulo e Aglomeração Urbana de Jundiaí, acesse o link correspondente ao município: Diadema, Santo André (Craisa), São Bernardo do Campo, São Caetano do Sul, Mauá, Rio Grande da Serra, Mogi das Cruzes, Guararema, Santa Isabel, Osasco, Barueri, Embu das Artes, Caieiras e Jundiaí. Observação: os levantamentos foram feitos a partir dos sites oficiais das prefeituras, para municípios como Cotia e Santana de Parnaíba, há informações em páginas de terceiros.
E assim como acontece com alguns shopping centers, existem lojas integradas ou muito próximas de estações, como são os casos a seguir: Extra integrado ao Shopping Metrô Itaquera (Estação Corinthians-Itaquera, Linha 3-Vermelha e Linha 11-Coral); Carrefour integrado ao Shopping Eldorado (Estação Hebraica-Rebouças, Linha 9-Esmeralda); das cercanias da Estação Estudantes (Linha 11-Coral), que contam com D’avó, Alabarce e Extra; do Extra integrado ao Grand Plaza Shopping (Estação Prefeito Celso Daniel-Santo André, Linha 10-Turquesa); do Sonda fronteiriço ao Mooca Plaza Shopping (Estação Ipiranga, Linha 10-Turquesa) e; do Carrefour nas proximidades da Estação Granja Julieta (Linha 9-Esmeralda), para não nos prolongarmos ainda mais, pois existem ainda muitas outras possibilidades.
Finalmente dependendo da loja, também é possível solicitar a entrega da compra (na Zona Leste da capital, o Higa’s realiza entregas, por exemplo), além disso, várias redes contam com serviço de comércio eletrônico, geralmente bastando que o cliente consulte a disponibilidade fornecendo o CEP de seu endereço. Caso tenha ficado interessado em comprar pela Internet, confira algumas opções a seguir: Carrefour, Dia, Extra, Mambo, Pão de Açúcar, Sonda e Veran.
Planejamento é tudo
A despeito do que pode parecer, fazer compras com o automóvel também exige planejamento: horários de pico, dias do rodízio de veículos, possíveis gastos com combustível e estacionamento etc, assim, o mesmo vale para o transporte coletivo. Não tem segredo. Planejar-se significa buscar as condições mais vantajosas para executar uma determinada atividade.
Como primeiro passo, conhecer as linhas que atendem os estabelecimentos a serem visitados ajuda bastante a escolher os melhores horários e rotas. Vale a pena se familiarizar para ganhar tempo e comodidade posteriormente. Aplicativos como o Moovit e o Trafi também podem ser bons assistentes para elaborar rotas (escrevemos um artigo a respeito em 2015, mas infelizmente ele já está meio obsoleto). É crucial não alimentar a ideia de que todos os transportes públicos estão lotados em todos os momentos, pois ela só beneficia a indústria automobilística e contribui para marginalizar o transporte público e seus usuários.
O segundo passo é facilitar o transporte das mercadorias adquiridas. Sacolas grandes e carrinhos são uma boa pedida, principalmente nas feiras. Cá entre nós: muitos idosos e idosas utilizam carrinhos desde sempre e ganham autonomia para fazer compras, estando por todos os lados e com certeza muitos de nós, jovens, já os vimos. Mesmo com idade mais avançada, andam a pé, fazem as compras com seus carrinhos e não raramente embarcam em ônibus e trens do Metrô e/ou da CPTM. Não deixa de ser funcional, embora não exista a glamourização atribuída ao automóvel.
O terceiro passo consiste em se preparar para imprevistos ou oportunidades, como ofertas que você considere imperdíveis. Carregue sempre uma sacola dobrada na bolsa ou mochila. Praticamente qualquer “ecobag” vendida nas grandes redes de supermercados serve e apresenta ótima durabilidade. E não menos importante, se precisar fazer as compras durante o horário de pico, avalie fatores como:
- O horário de funcionamento dos estabelecimentos em posições mais convenientes ao longo do trajeto;
- O horário de funcionamento dos estabelecimentos em posições mais convenientes no entorno de sua residência ou local de trabalho;
- Os horários menos acentuados do pico, quando o embarque se dá em condições mais favoráveis, os quais podem variar bastante (exemplo: o pico vespertino começa mais cedo na CPTM do que no Metrô, a situação da Estação Luz às 17h tende a ser muito pior do que a da Estação Sé);
- Se outras tarefas que podem ser resolvidas durante aquele momento, visando otimizar o tempo e/ou ocupá-lo de maneira a acessar o transporte quando o pico estiver menos acentuado;
- Possíveis caminhos alternativos, que podem ser mais longos, mas oferecem maior conforto, como linhas perimetrais que conectam bairros entre si. Exemplos de linhas perimetrais de São Paulo: Linha 233A-10 (veja detalhes na SPTrans e rota no Trafi) e Linha 233C-10 (veja detalhes na SPTrans e rota no Trafi);
- A possibilidade de utilizar linhas de caráter seletivo, que tendem a circular apenas com passageiros sentados, ao custo de uma maior tarifa. A Linha S172 de Guarulhos (veja a ordem de serviço e rota no Trafi) é um exemplo de seletivo que costuma ter baixa demanda, mesmo nos picos.
Para quem possui smartphone e computador com acesso à Internet, além de aplicativos como o Trafi e o Moovit, também é possível montar um quadro no Trello com informações úteis e sob medida para o cotidiano, o que acaba por sintetizar a maioria das abordagens feitas aqui. Observação: o blog do Trello tem muitas dicas para quem tem disposição para aprender a usar o programa.
Conclusão
Sem pretender esgotar o tema, esperamos que o artigo tenha contribuído para dar um panorama geral e diminuir o ceticismo de quem não abre mão do transporte individual. A Região Metropolitana de São Paulo é muito grande, portanto, muitos dos exemplos dados são incapazes de cobrir a diversidade e variedade existentes. Buscamos citar locais, lojas, aplicativos e sites, de maneira a tentar elucidar da melhor forma e mostrar que não estamos falando de algo que só pode ser feito em situações extremas, pelo contrário, a ideia foi mostrar que é absolutamente normal usar o transporte coletivo para ir até a rodoviária, comprar comida no supermercado ou até mesmo renovar o visual com novas peças de roupa, logo, também é absolutamente normal passear usando o transporte coletivo.
As opiniões aqui expressas foram emitidas sem qualquer afiliação com as marcas, empresas e serviços citados. Nenhum tipo de patrocínio ou comunicação prévia existiu.
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