Por Caio César | 15/03/2019 | 8 min.
Índice
Introdução
O Expresso Leste é um serviço da Linha 11-Coral (Luz-Guaianazes-Estudantes) da CPTM (Companhia Paulista de Trens Metropolitanos) que oferece a única ligação expressa sobre trilhos de toda a Região Metropolitana de São Paulo. Inaugurado em 27/05/2000, o Expresso Leste foi um divisor de águas na mobilidade da Zona Leste da capital, oferecendo um serviço regular e com trens refrigerados que permitiam ao passageiro pular duas estações entre Brás e Tatuapé e todas as estações entre Tatuapé e Corinthians·Itaquera.
Posteriormente o Expresso Leste chegou até a Estação Luz e o governo tem prometido ao decorrer dos anos que pretende expandi-lo até a Estação Palmeiras·Barra Funda, uma medida acertada e que já deveria ter sido viabilizada, diga-se de passagem. Em 2016, quando escrevemos uma crítica voltada exclusivamente ao Expresso Leste, identificamos publicações de outros veículos tratando da expansão até a Barra Funda, com promessas a partir de 2012; em 2019, o governo voltou a prometer a expansão da linha até a Zona Oeste da capital, conforme informações do site Ferroviando.
O surgimento do Expresso Leste não foi um acidente
As velhas estações do antigo tronco que deu origem à Linha 11-Coral perderam gradativamente utilidade, além disso, quando operacionais, não receberam melhorias pela RFFSA (Rede Ferroviária Federal Sociedade Anônima). É oportuno salientar que as estações antigas eram redundantes com as de um serviço que, quando atingiu sua plenitude no final dos anos 1980, dando origem à famigerada Linha 3-Vermelha (Palmeiras·Barra Funda-Corinthians·Itaquera), ofertava uma quantidade de lugares exorbitantemente maior do que um sistema de trem (sub)urbano combalido e anacrônico. Não é a toa que já se previa nos anos 1970 a necessidade de desativação de estações como as antigas Vila Matilde, Patriarca e Engo. Arthur Alvim (não confundir com as estações homônimas ou quase homônimas da Linha 3).
As obras que deram origem ao Expresso Leste até podem ter sido feitas a toque de caixa, mas não podemos dizer que a infraestrutura permanece inalterada desde então. Recentemente, a CPTM avançou com algumas demolições, como a da antiga Estação Vila Matilde, além disso, a oferta do Expresso Leste praticamente dobrou desde os anos 2000, atingindo os atuais 4 minutos de intervalo médio nos horários de pico.
Mesmo que a eventual lentidão dos trens dê margem para especulações, no sentido de que reconstruir as estações demolidas não afetaria o tempo de viagem significativamente, trata-se de uma linha de raciocínio simplista, pois velocidade não é tudo. A configuração expressa é um esforço de racionalização, sendo assim, quais seriam as justificativas que levariam a CPTM a induzir mais conflitos numa pequena porção de uma linha de 51 km, justamente num trecho redundante com uma linha de 22 km novíssima e com histórico de manutenção muito superior?
Outros caminhos
Em vez de flertar com a ideia de um serviço parador redundante, ainda que recapacitado, devemos lutar para que a CPTM:
- Melhore os cuidados com o plano de vias, para tanto, a companhia deveria demolir o que faltou e otimizar o uso da faixa de domínio;
- Melhore a sinalização, adotando a tecnologia CBTC (sigla que pode ser traduzida para Controle de Trens Baseado em Comunicação), o que permitiria elevar o patamar de oferta para atender a demanda atual, numa linha que é mais de duas vezes a extensão da 3-Vermelha (são 51 km contra 22 km, servindo mais de um município, com pelo menos duas centralidades regionais, Suzano e Mogi das Cruzes).
Ademais, é preciso lutar para que a CMSP (Companhia do Metropolitano de São Paulo, oficialmente abreviada como METRÔ):
- Também entregue uma sinalização com tecnologia CBTC;
- Implantar as PSDs (portas de plataforma) faltantes;
- Termine as linhas 15-Prata (atualmente Vila Prudente-Vila União, concedida à CCR ViaMobilidade 15) e 2-Verde (atualmente Vila Prudente-Vila Madalena).
Finalmente, ainda é preciso envolver a EMTU, o que exige o encadeamento de mais algumas lutas:
- Implantação do corredor Arujá-Itaquá-Ferraz (denominado Corredor BRT Metropolitano Perimetral Alto Tietê);
- Implantação do corredor Guarulhos-ABC (denominado Corredor BRT Metropolitano Perimetral Leste);
- Implantação do corredor Alto Tietê-São Miguel Paulista.
Também não seria um exagero afirmar que acabaria sendo mais fácil adicionar uma nova opção expressa usando parte da Marginal Tietê e seguir qualificando a infraestrutura existente, expressa e paradora, correspondente às linhas 3-Vermelha e 11-Coral. Não só poderíamos apostar que é mais fácil, como nos parece um caminho muito mais lógico. Uma opção expressa pelo miolo dos bairros, além de “virar as costas” para o tecido consolidado, escolhendo uma ou outra localidade para receber estações, sairia muito mais cara devido à necessidade de perfurar túneis.
Francamente, é extremamente difícil encontrar motivos plausíveis para retomar um atendimento redundante, que vai demandar estações novas (provavelmente com custo superior a R$ 60 milhões cada uma), contrariando pelo menos duas décadas de planos, que vinham, apesar das dificuldades, ganhando forma nos últimos anos.
Acreditamos que, gastando menos, com o preço de um expresso subterrâneo somado a estações redundantes entre Brás e Itaquera, obedecendo ao paradigma atual do Trem Metropolitano (que tem consagrado uma “arquitetura caixote”), sendo comparáveis aos edifícios das estações Franco da Rocha, Suzano e São Miguel Paulista, daria pra fazer:
- Uma linha expressa na Marginal Tietê, atrelada à Linha 12, com trens de dois andares dentro do gabarito atual (um dos pisos fica abaixo do nível da plataforma);
- Pelo menos reconstruir as estações do Alto Tietê que já estão com projeto pronto, como Eng. Manoel Feio, Itaquaquecetuba e Estudantes;
- CBTC na Linha 11-Coral e ATO (operação automática de trem) na Linha 12-Safira (Brás-Calmon Viana);
- Extensão das plataformas das estações novas da Linha 11 para receber trens de 12 carros;
- Adequação nas estações para melhorar o escoamento de passageiros (colocar as escadas rolantes faltantes em estações como Tatuapé, por exemplo);
- Comprar o material rodante adicional, tanto para o expresso na Marginal, quanto para uma Linha 11 com trens de 12 carros.
Observação 1: se 4 minutos correspondem a uma oferta de 15 trens/hora, sendo cada trem com capacidade de 2.600 passageiros, então temos 39.000 lugares/hora por sentido — capacidade estimada em conformidade com a especificação técnica AT8303–06, disponibilizada como parte da concorrência número 8190122011, que resultou na fabricação e entrega das atuais séries 8500 e 9500, prevendo uma ocupação de 8 pessoas por m² — , o que significa uma média de 325 passageiros por carro. Resultado: um trem de 12 carros com especificações similares transportaria 3.900 pessoas ante 2.600 de um trem de 8 carros, sendo possível estimar um cenário/pico para: (i) 2 minutos: incríveis 117 mil lugares/hora por sentido e; (ii) 4 minutos: 58.500 lugares/hora por sentido. Ufa!
Observação 2: a Linha 3-Vermelha oferta cerca de 60 mil lugares/hora por sentido (a duras penas). Daria para quase triplicar a capacidade da Linha 11, sendo que o governo não precisaria escavar um m³ de terra para tanto. Por questões de limitações físicas, mesmo com o CBTC a oferta não deverá aumentar significativamente na Linha 3 (o que deverá aumentar é a confiabilidade e controle fino dos trens, com frenagens e acelerações menos bruscas).
Observação 3: em 14/10/2016 publicamos artigo intitulado 15 ações para melhorar a CPTM na Zona Leste, cuja leitura é recomendadíssima.
Conclusão
Não faz sentido defender uma linha expressa nova que passe pelo miolo dos bairros, justamente locais que concentram pontos de interesse e hoje exigem a utilização de ônibus em conjunto com o sistema de trilhos. Na região do Tatuapé, que tem buscado se afirmar como um centro metropolitano na Zona Leste, o ritmo dos ônibus do Sistema Local da SPTrans é frenético, com linhas como a 3763–10 (Terminal Vila Carrão-Metrô Tatuapé) chegando e saindo lotadas, com intervalos baixíssimos e filas constantes de passageiros.
A conversão da Linha 11 para metrô, incluindo novo paradigma para trens, estações e oferta, faz muito sentido quando observada em conjunto com a rede futura (incluindo a EMTU, como salientei anteriormente). O trecho expresso paralelo à Linha 3 é pequeno, claro, mas está longe de ser desprezível. Hoje convivemos com terrenos vazios, que deveriam ter recebido obras de estações futuras da Linha 2-Verde; todos eles possuem uma inserção muito superior e haverá conexão com as linhas 3-Vermelha, 11-Coral e 12-Safira ao longo do trajeto.
Finalmente, se existisse uma sinergia imensa, a infraestrutura que conhecemos — das três linhas metroferroviárias da Zona Leste supracitadas, além da recente Linha 13-Jade, Eng. Goulart-Aeroporto·Guarulhos — poderia ser uma só, no sentido de não estar segregada, e isso mudaria completamente a lógica existente. A bitola já é a mesma e a alimentação poderia ser híbrida (há tecnologia e pelo menos um caso relevante de trens que suportam tanto terceiro trilho quanto catenária, no estadunidense Metro North). O gabarito dos trens poderia ser padronizado para viabilizar um potencial material rodante intercambiável a partir das limitações decorrentes da empreitada (provavelmente túneis da Linha 3 seriam o principal aspecto que definiria o gabarito). A sinalização também não seria um impeditivo e poderia ser unificada. Enfim, possibilidades. Claro que o arranjo atual não facilita.
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