Por Caio César | 31/07/2020 | 5 min.
Os apontamentos foram feitos durante uma reunião entre a entidade sindical e a CPTM (Companhia Paulista de Trens Metropolitanos), responsável pelos 273 km do Trem Metropolitano. A estatal tem sofrido desinvestimentos nos últimos anos e enfrenta o risco de ver sua malha fatiada entre diferentes concessionárias. O governo paulista, sob o comando de João Doria (PSDB), impõe uma agenda privatista que já mira, além das do par de linhas em questão, a Linha 7-Rubi (Luz-Francisco Morato-Jundiaí), como parte de uma controversa PPP (Parceria Público-Privada) para a implantação de um trem regional.
Os exemplos que nós vimos de todas as concessões foram extremamente prejudiciais, não só aos empregados, mas também para o usuário final: no caso do [trem de] carga, os clientes e, aqui, no caso da CPTM, os passageiros, podem ser prejudicados. (Claudinei Messias, presidente do Sindicato da Sorocabana)
Os sindicalistas consideram que a concessão, se concretizada, prejudicará os trabalhadores, ao elevar o nível de precariedade, bem como os usuários, a exemplo da caótica e engessada operação da SuperVia, concessionária da Central (Companhia Estadual de Engenharia de Transportes e Logística) na RMRJ (Região Metropolitana do Rio de Janeiro).
Quem recebe o primeiro impacto de todo o processo de privatização (e concessão, né?) é o trabalhador, porque os direitos são as primeiras que coisas que vão sendo jogadas fora, além do emprego, além da expectativa que se criou, se ficar até aposentar, toda aquela vivência dentro da empresa. Todas as privatizações que tiveram no estado de São Paulo, todas elas, causaram prejuízos absurdos para o estado (…) a Fepasa tinha trens de passageiros, em dois anos, terminou o período de exigência da concessão, as empresas ferroviárias do estado de São Paulo simplesmente retiraram os trens de passageiros, em menos de… estamos há quase 20 anos de concessão, 60% da malha ferroviária do estado de São Paulo já foi para o espaço, já destruiu, acabou. (Rogério Santos, diretor do Sindicato da Sorocabana)
Segundo levantamento da Revista Ferroviária, citado por Exame em 2019, menos da metade (42%) da malha ferroviária nacional está sendo explorada adequadamente, sendo que o restante está abandonado (31%) ou semiabandonado (27%). A malha da Rumo, principal dilapidadora do patrimônio que era da Fepasa, apresenta 91% de subutilização em toda a Malha Oeste, que avança pelo oeste paulista e Mato Grosso do Sul até chegar na Bolívia. Em 2018, a ABPF (Associação Brasileira de Preservação Ferroviária) mais uma vez lamentou o sucateamento das ferrovias e explorou algumas das possíveis causas para o abandono ao longo dos anos.
Sabendo da importância da união da classe trabalhadora, que passa, necessariamente, pelo fortalecimento do tecido sindical, nós do COMMU não podemos deixar de apontar que o cenário apontado pelo diretor do sindicato é, infelizmente, verdadeiro. Em sua dissertação de mestrado, Celia Regina Baider Stefani recupera que o processo privatizador da malha ferroviária nacional teve início em 1996, sendo alvo de denúncias por, entre outros motivos, abandono, depredação, subutilização do material rodante e pela extinção dos serviços de trens de passageiros de longo percurso (p. 17).
Sem pretensão de esgotarmos o tema, salientamos que a recuperação dos trens regionais (também chamados de trens intercidades) não pode ser capturada por objetivos eleitorais ou políticos de curto prazo. O transporte sobre trilhos, como bem lembrado naquela mesma reunião pelos sindicalistas, não pode ser refém do pior tipo de entreguismo: aquele que ocorre durante situações de crise, que depreciam o valor de nosso patrimônio, justamente o tipo de situação que parece exortar a busca por contratos fáceis, que sacrificam o futuro de milhões de pessoas e suas cidades,
Como já apontamos no passado, após realizarmos uma reunião com um representante do deputado estadual Carlos Giannazi (PSOL), consideramos que o horizonte das linhas 8 e 9, caso sejam assumidas pela iniciativa privada, é de congelamento dos investimentos, colocando em hiato projetos como o Expresso Oeste-Sul e basicamente interrompendo o esforço de modernização que vinha se desenrolando e amadurecendo desde a Divisão do Metropolitano da Fepasa, uma vez que as contrapartidas previstas não parecem fazer frente ao volume de investimentos necessários para o desenvolvimento da Sub-região Oeste da RMSP (Região Metropolitana de São Paulo), o que pode trazer consequências seríssimas não só para municípios com economia melhor desenvolvida, como Osasco e Barueri, mas também para municípios mais pobres, como Carapicuíba, Jandira e Itapevi.
Finalmente, o fato de o atual secretário dos transportes metropolitanos, Alexandre Baldy (Progressistas), ter admitido que o governo está avaliando a inclusão de um trem intercidades para Sorocaba no mesmo edital de concessão, muito nos preocupa. Tememos que as características atuais do Trem Metropolitano dificultem a manutenção de um serviço regional privado, especialmente devido ao traçado pouco adequado para velocidades competitivas em comparação com rodovias como a SP-280 (ditador Castelo Branco, concedida à CCR, que a explora como CCR ViaOeste). A concessão simplesmente não parece ser capaz de reunir os elementos de financiamento, de modelo de negócio e de arbitragem e conciliação de interesses necessários para garantir a convivência harmoniosa de serviços díspares, o desenvolvimento das cercanias e a evolução do Trem Metropolitano, que já deveria estar operando com intervalos de 3 minutos em média nos horários de pico.
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