Por Caio César | 03/11/2020 | 6 min.
O Diário de Mogi continua reciclando as baboseiras ditas em torno da expansão da Linha 11-Coral (Luz-Estudantes) até o distrito de Cezar de Souza, distante cerca de 5 km a leste do atual terminal da linha, construído na década de 1970. A edição de sábado passado, 24, pelo visto, não foi suficiente e novas reportagens baseadas na edição impressa de quinta-feira, 29, continuam sendo publicadas.
Em uma delas, publicada em 30/10/2020 e assinada por Larissa Rodrigues (a mesma que revelou desconhecimento em torno da ciclovia da Marginal Pinheiros, na capital paulista), o lobby da vez mira nos deputados Marcos Damásio (estadual, PL) e Marco Bertaiolli (federal, PSD). Apesar de enaltecer o papel dos mandatários, o texto, porém, não aponta emendas ou fontes de recursos para o custeio da empreitada, similarmente, não há detalhes sobre as supostas ações em prol de Mogi das Cruzes.
Sem grandes surpresas, Bertaiolli, que já foi prefeito do município, também enxerga o papel de metrô desempenhado pela Linha 11, em flagrante antagonismo com O Diário, que insiste em chamar os trens de “subúrbios”, como aconteceu em outra reportagem, assinada pela repórter Carla Olivo, que reforça estimativas, no mínimo, estranhas em torno dos custos das obras. Como apontado pelo COMMU recentemente, o montante de R$ 7,3 mi — em reais de 2011, que valiam cerca de 40% mais — dificilmente seria suficiente para custear a edificação de uma nova estação.
Quando o assunto é a redução do trânsito de veículos, o texto parece depositar todas as fichas nas costas da CPTM (Companhia Paulista de Trens Metropolitanos), responsável pela Linha 11, sem qualquer menção à intermodalidade, padrões de uso do automóvel e priorização dos ônibus no sistema viário. Numa simples reflexão em torno dos argumentos a favor das passagens de nível e da própria narrativa que tem sido construída nos últimos dias, chegamos à conclusão de que Mogi das Cruzes não deveria ser palco de polêmicas envolvendo passagens de nível, uma vez que a presença dos trens automaticamente representa a eliminação do tráfego excessivo de automóveis, consequentemente, eliminando congestionamentos.
Nada mais longe da verdade. Mogi enfrenta congestionamentos que, ainda que pequenos em comparação com as longas filas que se formam em avenidas do Centro Expandido da capital, são reflexo de décadas de priorização desavergonhada do automóvel. A prova maior é a pouca ou nenhuma preocupação com um debate sério em torno de uma infraestrutura tão cara e complexa, como é o caso do transporte sobre trilhos.
Salientamos ainda que, ao contrário de Damásio, não temos nenhuma expectativa positiva com relação à concessão das estações Jundiapeba, Mogi das Cruzes e Estudantes. E, em que pese sua participação na eliminação da transferência na Estação Guaianazes, estes esforços pouco ou nada adiantam se condenam Mogi das Cruzes a conviver com um sistema tipologicamente incorreto para o papel que desempenha, em outras palavras, trens muito mais pesados do que seria necessário.
Dever-se-ia, como temos dito há anos, promover uma mudança de rumo nas discussões: ao jornal, só resta jogar a toalha e admitir que a campanha contra o VLT (Veículo Leve sobre Trilhos) foi, além de provinciana e retrógrada, irresponsável. Com o engessamento da tipologia da Linha 11, houve a manutenção de um patamar mais elevado de custos, que não condiz com a demanda e a vocação da região. A manutenção do atual paradigma de operação da CPTM é um fracasso sob qualquer ponto de vista. Seja ele financeiro, social ou urbanístico.
A discussão sobre a eliminação das passagens de nível, que também aparece no texto assinado por Rodrigues, evidencia que o automóvel, apesar de ter uma capacidade irrisória, emitir poluição atmosférica e ser potencialmente mais letal, precisa gozar de prioridade no viário. Além de fazer obras bilionárias para atender uma demanda pouco expressiva e continuar operando serviços que não estão apoiados em esforços regionalizados de desenvolvimento, a CPTM ainda precisa evitar aumentar os conflitos entre o transporte ferroviário e o transporte rodoviário, afinal, o jornal deixa claro que os carros não podem esperar a passagem dos trens e enaltece o complexo viário construído no Centro Histórico Tradicional, que deixou os pedestres em último lugar na lista de prioridade das intervenções. O conflito não nasce da necessidade de reduzir ainda mais os intervalos no município, mas sim da ideia de que passagens de nível são intoleráveis, quando faria muito mais sentido otimizar a passagem de quem realmente precisa e desincentivar o uso do automóvel.
Para o caso de Mogi das Cruzes, não existe tecnologia ferroviária mais versátil do que o VLT. Em trechos com elevada segregação, como é o caso daquele entre Suzano e Jundiapeba, os trens, apesar de mais leves, poderiam desenvolver excelentes velocidades, enquanto trechos de menor segregação, mais integrados a áreas com grande fluxo de pedestres e veículos, poderiam circular com menor velocidade, mas muito maior capacidade de frenagem. As estações seriam menores, mais baratas e mais simples. Haveria a opção de operar uma linha circular no Centro Histórico e Tradicional, sem segregação, fazendo o papel de bonde (e potencialmente sendo aliada na eliminação completa do tráfego de carros de passeio). O VLT também torna mais factível a discussão de uma expansão até Sabaúna e Guararema, como parte do eixo de desenvolvimento turístico de uma política maior de desenvolvimento do território cortado pelos trilhos.
O vídeo do MAX é bastante didático para demonstrar o funcionamento de um bom VLT. Nos minutos iniciais, os trens correm paralelamente a uma rodovia, enquanto no meio do vídeo, circulam nas quadras da área central da cidade, em velocidade compatível com a urbanização existente, em conjunto com soluções adequadas de sinalização e mobiliário urbano. Outro bom exemplo de VLT é o da Baixada Santista, de propriedade da EMTU (Empresa Metropolitana de Transportes Urbanos), ameaçada de extinção por um projeto de lei recentemente aprovado.
Nem tudo, é claro, foi mau. O jornal acertou ao lembrar da MRS Logística, responsável pela operação dos poucos trens de carga que circulam após Estudantes e também ao colocar, ainda que indiretamente, a importância de investimentos para qualificar a infraestrutura de todas as quatro estações da CPTM que atualmente funcionam na cidade.
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