Por Caio César | 04/03/2021 | 7 min.
O atual governo estadual tem falhado na tentativa de tentar tornar a Linha 13-Jade (Eng. Goulart-Aeroporto·Guarulhos) mais atrativa. Em que pese as limitações orçamentárias, os esforços envidados até o presente momento parecem ter sido apostas, no mínimo, duvidosas. A ligação entre a capital e o aeroporto internacional foi implantada no primeiro quadrimestre de 2018.
Não há como o governo imprimir uma marca positiva diante das carências históricas de infraestrutura que tem falhado em sanar. O fracasso da Linha 13-Jade revela não só problemas no formato da concessão federal e na postura sabotadora dos atores privados responsáveis por um dos principais aeroportos internacionais da América Latina, mas também teimosia por parte do governo estadual.
Em primeiro lugar, o governo insistiu em terminar a linha na periferia da Zona Leste, utilizando a nova Estação Engenheiro Goulart, que é, sim, magnífica e possui um acesso cômodo ao Parque Ecológico do Tietê. O problema é que as pessoas parecem não ter aquela região como destino (para não falar nos problemas do parque e da interrupção do projeto Parque Várzeas do Tietê, do qual o Parque Ecológico do Tietê seria parte). Temos, já de largada, uma falha grave na articulação da malha e na própria articulação desta com projetos ambientais e urbanos de vulto, com caráter estruturador e transformador relevantes.
Em segundo lugar, o aumento da oferta foi travado por problemas cuja natureza nunca foi escrutinada pelo Legislativo ou pela imprensa, que possuem muito mais recursos do que nós, pessoas que não moram dentro do Centro Expandido. O resultado é que a Linha 13 não tem um sistema de sinalização com controle automático de trem, forçando uma operação manual que produz intervalos na ordem dos 30 a 20 minutos. Patamares muito altos para acessar um aeroporto e também muito pouco competitivos se comparados com opções mais diretas da EMTU (Empresa Metropolitana de Transportes Urbanos, em processo de extinção por força de lei) para acesso à Linha 1-Azul (Turucuvi-Jabaquara) pelos habitantes de Guarulhos. Em meio ao descompasso com a sinalização, o governo entregou recentemente o último trem chinês.
Agravando o quadro dramático da sinalização, temos uma concessionária que fez pouco-caso do poder público e que, até o momento, não entregou nenhum tipo de solução articuladora de alto desempenho entre a estação da CPTM (Companhia Paulista de Trens Metropolitanos) e os terminais aeroportuários. O transbordo para ônibus comuns de piso baixo, feito por meio de um ponto de ônibus rústico, em flagrante contraste com as instalações dos terminais, evidentemente, também não parece ajudar.
Em terceiro lugar, temos a gambiarra feita na Estação Luz. Um “puxadão” que “deu um tapa” numa antiga plataforma que estava abandonada há décadas, instalando uma linha de bloqueios adicional. Tudo para poder prover uma ligação pseudo-expressa entre o Centro de São Paulo e Cumbica. A tarifa mais alta e a oferta irrisória de viagens, para variar, não ajudaram. O usuário da Linha 11-Coral (Luz-Estudantes), uma das mais movimentadas do país, precisava amargar atrasos, enquanto a Linha 13 disparava um trem com menos de 10 pessoas, que, apesar de não parar nas estações Brás e Tatuapé, passava por elas, provocando interferências.
O único serviço da Linha 13 que realmente apresentava alguma demanda relevante (leia-se: mais de 300 pessoas usando, superando a lotação de banco, mas insuficiente para ter muita gente em pé), era o chamado Connect. O Connect era uma forma silenciosa de admitir que a Linha 12-Safira (Brás-Calmon Viana) não tinha capacidade de atender adequadamente a região da Penha e da Cangaíba, então, para que os usuários não ficassem ilhados em Eng. Goulart nos horários de pico da manhã ou enfrentassem um périplo para desembarcar ali no pico vespertino, o governo espremeu uma operação compartilhada que congestionava a Linha 12, que permitia levar trens da Linha 13 até o Brás, fornecendo conectividade minimamente satisfatória.
O Connect, único serviço verdadeiramente útil e funcional, foi descontinuado. O governo, então, implantou outro pseudo-expresso, mas sem tarifa diferenciada. O trem obedece parada das seguintes maneiras:
- Sentido Aeroporto·Guarulhos: Luz-Guarulhos·Cecap-Aeroporto·Guarulhos;
- Sentido Luz: Aeroporto·Guarulhos-Guarulhos·Cecap-Brás-Luz.
Foram suprimidas, portanto, as estações Tatuapé e Brás, sendo Brás apenas no sentido Aeroporto·Guarulhos. Se um usuário desembarcar no Brás pela manhã, precisará fazer uma viagem negativa no período vespertino para poder voltar para Guarulhos. O acesso ao Tatuapé, uma centralidade regional da Zona Leste, também exige viagens negativas.
Francamente, o ganho parece ter sido muito pequeno. O governo parece ter suprimido as paradas para vender a imagem de um serviço expresso melhorado, quando, na realidade, o serviço continua capenga, em virtude do compartilhamento de trilhos e estações. Questionada sobre a decisão sob o amparo da Lei de Acesso à Informação (Lei nº. 12.527/2011), a CPTM justificou que suspendeu os dois serviços anteriores em virtude da pandemia e que, quando passou a ter funcionários suficientes, implantou um novo serviço a partir de uma decisão operacional, sem “estudo específico formalizado em relatório”:
Em relação à manifestação encaminhada a CPTM informa que por conta da pandemia COVID-19, os serviços do AIRPORT EXPRESS e CONNECT foram suspensos, visando a alocação os recursos disponíveis para os serviços regulares (Linha 12-Safira e Linha 13-Jade).
Com a retomada de disponibilidade de quadro, a CPTM, visando maior eficiência operacional, passou a operar com novo serviço a partir de 01/12/2020, que funciona a cada hora, com tarifa unificada (e não mais diferenciada) e durante todo o horário de operação comercial.
Esclarecemos não existir um estudo específico formalizado em relatório, tratando-se de uma decisão operacional, que passou a beneficiar os passageiros de Guarulhos com viagens diretas até o centro (Luz) a cada hora, com tarifa unificada com a do sistema metroferroviário.
Para piorar a situação, a expansão da Linha 13-Jade entrou em hiato. A atual administração não está comprometida com a construção das estações pós-aeroporto, em direção a outros bairros da periferia guarulhense. Sabendo que a tipologia da Linha 13 na região é de uma estrutura elevada, tirando proveito de rodovias, a expansão seria uma obra de menor custo e complexidade em comparação com qualquer linha similar em subterrâneo.
Outro hiato preocupante, este com viés engavetador muito maior, é o da expansão da Linha 13 em direção à Zona Sudeste, rompendo completamente com a dependência das vias da Linha 12, de forma a proporcionar uma conectividade muito mais robusta, além de maior capilaridade do atendimento, concorrendo parcialmente com o traçado da futura Linha 2-Verde expandida (Dutra-Vila Madalena). Suspeitamos que a Companhia do Metropolitano, por gozar de maior prestígio e estrutura burocrática, além de resultados financeiros ligeiramente superavitários, tem vencido a corrida por recursos.
Diante do que parece ser uma preservação dos interesses da Cia. do Metrô em relação à Linha 2, a CPTM acaba ficando refém de uma linha novíssima, mas atrofiada. A operação da Linha 13 é, muito provavelmente, extremamente deficitária, mas a Cia. do Metrô não precisa prestar contas sobre ela, preservando seu status de estatal superavitária.
Em quarto lugar, o governo decidiu pegar carona e incluir a Linha 13-Jade no edital de expansão da Linha 11-Coral em direção à Estação Palmeiras·Barra Funda, uma promessa quase lendária do Executivo. A Linha 13, então, passaria a poder operar até a Zona Oeste, ganhando um pouco mais de capilaridade, ao custo de, provavelmente, prejudicar ainda mais os passageiros de uma série de bairros populosos do extremo leste paulistano, além de outras quatro cidades do Alto Tietê (Ferraz de Vasconcelos, Poá, Suzano e Mogi das Cruzes). A medida é insatisfatória, porque não envolve a questão da sinalização, não garante harmonia no compartilhamento de trilhos e, principalmente, não se debruça sobre o trecho crítico de maior extensão, entre Brás e Eng. Goulart, dependente da Linha 12-Safira.
Enquanto o governo estadual continuar preterindo a CPTM e espremendo uma infraestrutura centenária até os limites dela (e da paciência de quem dela depende), não teremos bons resultados. É provável que o governo conte com uma demanda relativamente baixa, mesmo com segundo puxadinho da Linha 13 até a Barra Funda, até porque, suspeitamos que, mesmo na hipótese de a demanda se mostrar expressiva, não haverá capacidade para atendê-la.
Finalmente, cabe lembrar que, passados cerca de três anos da inauguração da única linha metroferroviária que avança em território guarulhense, ainda não há nenhum tipo de integração tarifária, o que limita a intermodalidade Trem Metropolitano-ônibus municipal.
Se você ainda não acompanha o COMMU, curta agora mesmo nossa página no Facebook e siga nossa conta no Instagram. Veja também como ajudar o Coletivo voluntariamente.
comments powered by Disqus