Por Caio César | 16/01/2022 | 19 min.
Índice
Arrogância
Mais uma vez, O Diário de Mogi ignorou sua incompetência, tanto do ponto de vista técnico, quanto do ponto de vista eleitoral, para atacar a — há muito sepultada pelo governo estadual — possibilidade de modernização do trecho mogiano da Linha 11-Coral (Luz-Estudantes) da CPTM (Companhia Paulista de Trens Metropolitanos) com conversão tipológica: de trens pesados para trens leves.
Ninguém elegeu o jornal para governar São Paulo ou Mogi das Cruzes. Ninguém avalizou o teor das opiniões publicadas em suas páginas, por vezes, sob um disfarce noticioso. O Diário de Mogi pode ter poder político como mídia local, mas não tem capacidade técnica e não está com a caneta do Palácio dos Bandeirantes.
Como já esclarecemos no passado, a expansão da Linha 11-Coral, por culpa da campanha de envenenamento da opinião pública que continua a ser empreendida pel’O Diário, se tornou extremamente cara, e seguirá encarecendo em virtude da deterioração do Real frente ao Dólar dos Estados Unidos e da consolidação de um PIB (Produto Interno Bruto) nacional constituído pela exportação de produtos primários (notadamente soja, proteína animal e minério de ferro e seus concentrados).
A despeito das investidas dos textos risíveis do jornal, inclusive superestimando a pressão do Legislativo mogiano, a expansão da Linha 11-Coral está longe de ser uma tarefa trivial.
Alegando que VLTs (veículos leves sobre trilhos, sigla utilizada para descrever bondes modernos e outros trens leves) não compõem um “transporte ferroviário de verdade”, o editorial publicado no último sábado, 15, regurgita insistentemente a noção de que Mogi das Cruzes é servida por trens de subúrbio e que há uma herança centenária que precisa ser defendida. De fato, há uma herança centenária, mas O Diário de Mogi se equivoca ao confundir defesa com estagnação e inflexibilidade.
Herança e cegueira
Desde 2014, temos explicado que o transporte ferroviário não está preso a dicotomias rígidas e conceitos restritivos, principalmente quando múltiplas tecnologias são empregadas para desenhar infraestruturas e serviços. O transporte ferroviário é uma ferramenta para solução de problemas logísticos, tanto de pessoas, quanto de mercadorias, tendo capacidade para estabelecer ligações em diferentes escalas, nas quais as relações entre sociedade, território e infraestrutura delas decorrentes formam uma teia complexa e interdependente. Em outras palavras, o transporte ferroviário não é um fim em si mesmo e pode alimentar dinâmicas extremamente complexas.
Mogi das Cruzes é atendida por um serviço com intervalo de metrô, conforto de metrô, tarifa de metrô e conectividade de metrô. Sua posição na RMSP (Região Metropolitana de São Paulo), que nada mais é do que uma regionalização artificial, pouco tem importado para definir as características do serviço, as quais sofreram alterações ao longo da história.
A noção de subúrbio, quando utilizada na periferia do capitalismo, está associada a subdesenvolvimento e, não raramente, pode ser utilizada de forma extremamente genérica e ambígua. O dicionário Oxford oferece duas definições bastante intuitivas, facilmente consultáveis utilizando o Google com o termo de busca “subúrbio”:
- No Terceiro Mundo, periferia das cidades ou aglomerado de terrenos de difícil utilização, carentes de serviços, nos quais o valor da terra é baixo e o transporte, precário, sendo, por isso, seu valor locativo o único acessível às classes menos favorecidas.
- Nos países desenvolvidos, área de expansão espacial das cidades resultante da formação de uma classe média de renda alta, que busca localização residencial na qual desfrute de um espaço confortável e ambientes saudáveis, relativamente próximos do centro urbano.
Mogi das Cruzes é uma cidade polarizadora de deslocamentos há décadas, tendo recebido uma estação nos anos 1970 principalmente para atender duas universidades privadas, no que então era um perímetro de expansão urbana, absolutamente incipiente. Naquela década, ainda que a RFFSA (Rede Ferroviária Federal Sociedade Anônima) não tivesse a capacidade e visão necessárias para compreender os desafios ligados à metropolização, inclusive adotando postura combativa em relação aos esforços municipais da capital na construção de uma rede de metrô (vide dissertação de Ramalhoso, p. 50-56), tanto o fenômeno da metropolização, quanto o desenvolvimento endógeno de Mogi das Cruzes, já estavam dados.
Além da criação da RMSP em 1973, a Fepasa (Ferrovia Paulista Sociedade Anônima), melhor compreendendo os desafios metropolitanos, iniciou um programa de modernização dos trechos de sua malha que, hoje, constituem aquilo que conhecemos como linhas 8-Diamante (Júlio Prestes-Itapevi-Amador Bueno) e 9-Esmeralda (Osasco-Grajaú, futuramente Osasco-Varginha). A considerável mudança paradigmática, migrando de uma operação baseada em tabela horária para uma operação baseada em intervalos, a sofisticação e maior automatização do controle e operação dos trens, a priorização dos deslocamentos em escala metropolitana em detrimento de cargas e passageiros em escala regional e nacional, a reconstrução de estações com vistas ao aumento do conforto e capacidade/hora, a busca por integração física e tarifária, entre outros atributos, foram os pilares daquilo que a antiga estatal denominou Trem Metropolitano.
Com a criação da CPTM em 1992 e a desestatização da malha federal, que na altura já havia incorporado a Fepasa, o Trem Metropolitano continuou evoluindo no tempo e no espaço, se tornando o serviço e paradigma de toda a malha da então novíssima estatal paulista. O Plano Real, o fim da hiperinflação e a estabilidade política, além da sanitização das contas do Executivo paulista, podemos supor, parecem ter contribuído drasticamente para possibilitar uma maior injeção de recursos na CPTM.
Defrontando-se com décadas de crescimento urbano pouco regulado, desigualdade avassaladora e desinvestimento na infraestrutura ferroviária, a CPTM, em meio a um conjunto muito grande de decisões do Executivo, algumas mais acertadas do que outras, mas cuja discussão foge do escopo deste artigo, passou a basicamente reconstruir toda a malha, respondendo às pressões impostas pela extremamente ineficiente e violenta configuração do vasto território servido por seus trilhos. Leia-se: muita demanda de viagens para pouca oferta de lugares.
O produto dessas transformações, que O Diário supõe evocar favoravelmente para uma expansão cara, difícil e improvável, inclui a atual Linha 11-Coral, tal como a conhecemos.
Tronco
Antigo tronco da Linha Leste, na denominação superada da RFFSA e CBTU (Companhia Brasileira de Trens Urbanos), a atual Linha 11 é, seguramente, um dos mais movimentados serviços de metrô da América Latina. Seu intervalo de 4 minutos nos picos é superior ao oferecido pelo metrô da capital fluminense, a segunda maior depois de São Paulo. Se considerarmos a “calha central” da CPTM entre as estações Brás e Lapa, a oferta é tão competitiva quanto aquela do trecho entre as estações Central e Botafogo do Metrô Rio. Com horizonte de expansão até a Estação Palmeiras·Barra Funda, o gigantismo da Linha 11-Coral engole completamente a narrativa provinciana d’O Diário.
O traçado da Linha 11 teve papel embrionário no surgimento de diversos bairros bem conhecidos da Zona Leste paulistana, tais como Belém, Tatuapé, Vila Matilde e Itaquera. Sua inserção foi suficientemente estratégica para a construção de uma linha paradora paralela e adjacente, originalmente chamada de Linha Leste-Oeste e atualmente denominada Linha 3-Vermelha (Palmeiras·Barra Funda-Corinthians·Itaquera), que permitiu a acertada desativação das estações redundantes e obsoletas negligenciadas pela RFFSA.
A despeito de um ego tão grande a ponto de fazer inveja a Júpiter, O Diário de Mogi precisa entender que a Linha 11 nunca existiu para atender apenas a população mogiana. É problema único e exclusivo d’O Diário não ter capacidade, solidariedade e caráter para compreender o que se passa fora dos limites de Mogi das Cruzes, tentando subjugar uma dinâmica metropolitana complexa a interesses empoeirados de quem ainda enxerga Mogi das Cruzes como um subúrbio, não entendendo que o fortalecimento de dicotomias do tipo centro-periferia pode ter efeitos deletérios bastante perversos e duradouros.
Cezar de Souza não encontrará na CPTM a “bala de prata” para resolver seus problemas, principalmente de uso e ocupação do solo, que dependem fundamentalmente da legislação urbanística local e de diálogo com os empreendedores do mercado imobiliário. Ademais, nenhum veículo sério se propõe a falar de crescimento urbano e populacional sem apresentar dados e consultar especialistas. A menos que O Diário de Mogi apresente dados e análises contundentes, o argumento de que Cezar está passando por um crescimento explosivo não passa de uma tática para chamar a atenção. E adiantamos que não podem ser dados irreais, como já aconteceu no passado, quando o pasquim estimou custos completamente fora da realidade, sem perceber quão ridículos eram os números, numa clara demonstração de que não tem ideia dos custos de uma infraestrutura ferroviária pesada. Até o momento, o que sabemos com clareza é que há investimentos em empreendimentos imobiliários em andamento, que podem, sim, criar uma demanda relevante de passageiros no futuro, mas não significa que irão, nem que os negócios se manterão sólidos.
O principal desafio da CPTM com relação à Linha 11-Coral é evitar um colapso similar ao das décadas de 1980 e 1990, enquanto simultaneamente busca paradigmas e soluções compatíveis com o território e o potencial transformador do transporte público sobre trilhos, o que significa que a estatal provavelmente precisará aumentar a capacidade ao longo dos trechos mais críticos, ao mesmo tempo que não será beneficiada se contribuir para fortalecer o subdesenvolvimento ao redor de suas estações. Neste sentido, Mogi das Cruzes é, provavelmente, o município menos problemático de todos os servidos pelo transporte sobre trilhos no leste metropolitano.
Como é comum no desenho de políticas públicas, é preciso fazer escolhas muito duras, potencialmente desagradando centenas ou milhares de pessoas. Do nosso ponto de vista, Mogi das Cruzes deveria ter seu papel de centralidade fortalecido, e não enfraquecido. A grande pergunta que precisa ser feita é: do ponto de vista de um negócio, se é tão fácil assim para a população sair de Mogi das Cruzes para ir a São Paulo, quais seriam as vantagens de investir e se arriscar em Mogi em primeiro lugar?
Prevê-se, com a expansão da Linha 2-Verde (Vila Madalena-Vila Prudente, futuramente Vila Madalena-Penha), uma articulação muito mais fácil entre a Zona Leste e o quadrante sudoeste, passando pela Avenida Paulista. Por que ir para Mogi das Cruzes, quando uma transferência na Estação Penha permitirá acessar a Linha 2-Verde e suas múltiplas estações ao longo da avenida?
Escolhendo
Francamente, a janela de oportunidade foi perdida e a CPTM não tem recursos nem para iniciar uma conversão para VLT, nem para expandir com trens pesados, mas podemos caminhar para a conclusão deste artigo imaginando quais seriam os cenários possíveis num contexto econômico mais favorável. Para fins de sanidade mental e simplicidade, vamos descartar a possibilidade de concessão das linhas da CPTM que atendem o leste metropolitano. A possibilidade de concessão de estações não será discutida, mas teria potencial para permitir a construção de empreendimentos de uso misto, a exemplo do que deverá ser feito em terminais de ônibus das estações Carrão e Tatuapé, conforme comentamos em dezembro de 2021.
Dada uma certa distância, sob influência dos efeitos socioeconômicos do Centro Expandido de São Paulo, é bastante difícil conciliar os atributos “acesso fácil” e “desenvolvimento pujante”, entretanto, adotando uma visão de desenvolvimento integrado, podemos buscar padrões de desenvolvimento orientado ao transporte, com potencial para estimularem o surgimento e manutenção de múltiplas centralidades. O objetivo final é constituir um eixo com centralidades de diferentes padrões, mas suficientemente capazes de estimular dinamismo ao longo da maior parte do horário de funcionamento do transporte público diurno. Não há a busca por homogeneidade, mas uma tentativa de reequilíbrio em que a heterogeneidade é considerada aceitável, ou seja, embora não alimente a ilusão de que Mogi das Cruzes seria capaz de concorrer de igual para igual com as regiões de avenidas como Paulista, Berrini e Faria Lima, existe uma tentativa de ampliar a geração de empregos (principalmente aqueles mais sofisticados, com capacidade complexificadora em cadeia) e os efeitos-de-rede das firmas que escolhem Mogi das Cruzes em detrimento de outras localidades.
Pressupostos e condicionantes
Com o passar do tempo, à medida que avançamos em nossas carreiras profissionais e acadêmicas, passamos a enxergar o território e seus problemas de maneira mais complexa e abrangente, assim, considerando nossa trajetória e também os artigos já produzidos acerca de Mogi das Cruzes e da Sub-região Leste, gostaríamos de iniciar esta seção deixando claro que existem algumas questões que estão sendo assumidas, ou seja, que há algumas hipóteses que estão sendo tomadas como válidas e verdadeiras, a saber:
- Uma quantidade não desprezível dos deslocamentos se dá internamente em Mogi das Cruzes;
- Outra quantidade não desprezível dos deslocamentos se dá entre municípios do Alto Tietê e Mogi das Cruzes, sobretudo daqueles cujas áreas centrais são atendidas pela CPTM;
- A manutenção de deslocamentos pendulares entre Mogi das Cruzes e a capital é enxergada como um fenômeno tóxico e indesejável.
Sabendo de antemão que nossa visão é antagônica em relação àquela disseminada pel’O Diário de Mogi, um dos principais jornais do Alto Tietê, defensor da manutenção de serviços suburbanos pendulares, existem mais uma série de condicionantes não negociáveis, que resumem pontos nevrálgicos dos capítulos anteriores:
- A CPTM não opera “trens de subúrbio”;
- Utilizar a categoria “trens de subúrbio” para se referir aos serviços prestados pela CPTM é um desserviço;
- Termos como “subúrbio” e “periferia” não raramente suscitam uma complexa problemática, mas iremos utilizá-los como sinônimos um do outro e considerar que se referem a localidades geograficamente periféricas em relação aos principais núcleos de atração de viagens da capital paulista, se afastando da dimensão sociológica;
- Ainda que, de jure, a CPTM não opere serviços de metrô, consideramos que todas as linhas funcionam de facto como tal e que há um complexo processo de retroalimentação em curso, no qual são componentes a modernização e aumento vertiginoso da oferta de lugares no Trem Metropolitano, bem como as pressões demográficas e outras dinâmicas territoriais das cercanias;
- Serviços e sistemas de metrô não são produtos de prateleira e a Companhia do Metropolitano de São Paulo (METRÔ, na abreviação oficial, CMSP, na abreviação adotada pelo Coletivo) não é o modelo a ser perseguido.
Um novo paradigma
A construção de um novo paradigma envolve uma repolarização dos deslocamentos e atividades, assim sendo, em conjunto com Guararema, o município de Mogi das Cruzes figuraria como uma espécie de plataforma macrometropolitana de integração entre São Paulo e o Vale do Paraíba. Trata-se de uma noção que reforça a importância de repolarizar os deslocamentos, desconcentrando o desenvolvimento de atividades econômicas sofisticadas e oferecendo a oportunidade de constituir um corredor de desenvolvimento, marcado por alguns nós polarizadores notáveis, para além dos existentes no Centro Expandido paulistano:
- Tatuapé, atualmente concentrando os escritórios mais sofisticados da Zona Leste e também um polo de gastronomia e boemia, com espaço para fortalecimento, principalmente buscando a ocupação dos escritórios com negócios complexos (tecnologia da informação, tecnologia financeira, pesquisa e desenvolvimento etc);
- Itaquera, potencial de fortalecimento do caráter institucional e educacional (ampliação do número de vagas de ensino técnico e superior), do comércio (refuncionalização e ampliação do shopping center) e do estádio (agenda robusta de shows e espetáculos);
- Suzano, potencial de sofisticação do Quadrilátero Central, indo além do comércio popular;
- Mogi das Cruzes, potencial de sofisticação do Centro Histórico e Tradicional, indo além do comércio popular e do papel institucional, este último também presente no Centro Cívico, cujo o entorno, assim como acontece no Tatuapé, abriga escritórios sofisticados e um polo de gastronomia e boemia, ambos com similar potencial de fortalecimento.
Considerando os nós, todos atendidos pela Linha 11-Coral, compreendemos que a linha deveria ser discutida buscando articulação entre os governos municipais de Mogi das Cruzes e de Guararema e o governo estadual paulista. Sozinha, a expansão não se justifica: é preciso acrescentar uma camada adicional aos planos diretores dos dois municípios e resgatar princípios do PDUI (Plano de Desenvolvimento Urbano Integrado) da RMSP, assim, a empreitada deveria priorizar os seguintes aspectos:
- Fortalecimento de Mogi das Cruzes como centralidade;
- Intensificação do uso e ocupação do solo ao longo da faixa de domínio;
- Compactação do tecido urbano lindeiro à ferrovia;
- Integração tarifária e intermodal;
- Adoção de paradigmas operacionais e tecnológicos compatíveis com o contexto local e articulação regional pretendida.
De todos os aspectos elencados, o último é o mais problemático. Os cenários possíveis poderiam ser os seguintes:
- Converter todo o trecho mogiano da Linha 11 para metrô leve utilizando VLTs, com mudança tipológica a partir de Suzano no sentido Estudantes, aumentando a oferta a partir de Suzano no sentido Luz/Barra Funda. Facilitar-se-ia a expansão até Cezar de Souza e Guararema;
- Converter parte do trecho mogiano da Linha 11 para metrô leve utilizando VLTs, com mudança tipológica a partir de Estudantes para eventuais expansões sentido Guararema, cujo aumento da oferta a partir de Estudantes no sentido Luz/Barra Funda estaria condicionado ao fechamento de todas as outras passagens de nível. Facilitar-se-ia a expansão até Cezar de Souza e Guararema;
- Não converter nada e gastar bilhões para atender Cezar de Souza sem estimular o surgimento de mais um conflito viário e político no cruzamento da linha com a passagem de nível da Avenida Manoel Bezerra Lima Filho, que é parte da rodovia SP-88 (Mogi-Dutra), facilitando politicamente a eliminação das outras passagens de nível e o aumento da oferta a partir de Estudantes no sentido Luz/Barra Funda;
- Não converter nada e gastar menos para atender Cezar de Souza estimulando o surgimento de mais um conflito viário e político no cruzamento da linha com a passagem de nível da Avenida Manoel Bezerra Lima Filho, que é parte da rodovia SP-88 (Mogi-Dutra), dificultando politicamente a eliminação das outras passagens de nível e o aumento da oferta a partir de Estudantes no sentido Luz/Barra Funda. A expansão até Guararema seria possível, mas mais cara utilizando trens pesados.
Este primeiro cenário, outrora rejeitado pel’O Diário, utilizaria composições do tipo tram-train, uma tecnologia de VLT capaz de apresentar bons níveis de desempenho em faixas segregadas de domínio. Se, por um lado, nosso primeiro cenário provavelmente obrigaria a pessoa usuária a realizar uma transferência obrigatória em Suzano, por outro, significaria uma expansão de 22,4 km (distância comparável à extensão de toda a Linha 3-Vermelha), entre Estudantes e Guararema, passando por Cezar de Souza, Sabaúna e Luís Carlos. De forma rudimentar, seriam estas as distâncias aproximadas:
- 6,5 km entre Guararema e Luís Carlos;
- 10,8 km entre Guararema e Sabaúna;
- 18,3 km entre Guararema e Cezar de Souza;
- 22,4 km entre Guararema e Estudantes.
Já o segundo cenário provavelmente desagradaria o pasquim, mas seria o mais fácil, exceto pelo aumento da oferta. Mesmo com o complexo viário construído pela prefeitura de Mogi das Cruzes, a recente notícia de fechamento da passagem de nível da Avenida Deodato Wertheimer foi alvo de críticas por Marco Bertaiolli (PSD), deputado federal e ex-prefeito do município. A vantagem em relação aos cenários 3 e 4 é o barateamento e facilitação da expansão em direção a Cezar de Souza e Guararema.
O cenário 3 parece ser o desejado pel’O Diário, mas é bastante improvável, como já argumentamos em outro artigo. E o quarto cenário é o mais precário de todos e seu custo político provavelmente o torna ainda mais improvável, mesmo com o barateamento das obras. Há que se considerar, ainda, que o quarto cenário preserva o material rodante pesado, o que pode dificultar a expansão até Guararema por décadas.
Já ventilamos propostas envolvendo VLTs diversas vezes, como quando, por exemplo, rebatemos pela primeira vez o pleito de uma ciclovia que retiraria espaço dos trens em 2020. Sem dúvidas, converter todo o trecho mogiano seria uma obra grandiosa, que, entretanto, se fosse feita em conjunto com os municípios, poderia revolucionar o Alto Tietê.
Independente do cenário, Mogi das Cruzes poderia comercializar CEPACs (certificados de potencial construtivo adicional) para estimular a verticalização do entorno norte da Estação Estudantes e financiar obras no perímetro, incluindo a reconstrução da estação. Há também oportunidades no Mogilar, na face norte da Estação Mogi das Cruzes, como extensão natural do Centro Histórico e Tradicional, seguindo padrão similar, bem como no entorno imediato da antiga estação de Cezar de Souza e sua passagem de nível, rompendo com o padrão de empreendimento imobiliário atual, que entrega baixa qualidade urbanística.
Guararema, Mogi das Cruzes e o estado poderiam buscar um arranjo consorciado para o desenvolvimento turístico do tramo leste da Linha 11 entre Sabaúna e Guararema. Um arranjo consorciado também poderia ser possível para o desenvolvimento de um masterplan (plano diretor) para a área. Aproveitando o tecido socioeconômico existente e a flexibilização das rotinas de trabalho de parcelas da classe trabalhadora com o trabalho remoto, Mogi das Cruzes deveria buscar capturar a possível movimentação de profissionais altamente qualificados e bem remunerados, principalmente aqueles ligados ao setor de tecnologia da informação. Como sempre destacamos, o município já oferece excelentes bares e restaurantes — já até recomendamos alguns deles! —, permite fácil acesso a serviços públicos e abriga os principais estabelecimentos comerciais do Alto Tietê.
Articulando os serviços sobre trilhos e o transporte sobre pneus, Guararema poderia funcionar como um elo entre Jacareí, São José dos Campos, Mogi das Cruzes e São Paulo. Na prática, um papel que já é desempenhado hoje, mas de forma pouco qualificada em virtude da regulação frouxa dos serviços de ônibus intermunicipais suburbanos da Artesp (Agência de Transporte do Estado de São Paulo). Com modelos operacionais e tarifários adequados, poder-se-ia viajar entre Guararema, Jacareí e São José dos Campos com rapidez, sendo a Linha 11-Coral o tronco para deslocamentos ainda maiores, voltados a Mogi das Cruzes e São Paulo. Infelizmente, como apontamos em 2019, a remoção dos trilhos da Central do Brasil em Jacareí durante a gestão de Marco Aurélio de Souza (PT) em 2004, torna difícil avançar para além de Guararema.
Contextualização No final de maio, O Diário de Mogi, transparecendo a miopia que tipicamente assola as reportagens do tabloide mogiano sobre o transporte metroferroviário, bradou sobre o nebuloso trem intercidades entre as regiões metropolitana de São Paulo e do Vale do Paraíba e Litoral Norte: Só não definiu se os trens de passageiros virão por Mogi, dividindo espaço com os subúrbios, ou se utilizarão o ramal do Parateí, o que alijaria a cidade dessa melhoria.
Considerando ainda as oportunidades ligadas à Linha 12-Safira (Brás-Calmon Viana), podemos vislumbrar ainda possibilidades para oferta de serviços convergentes, mesclando atendimentos de caráter urbano e seletivo a partir de Suzano e, dependendo da convergência desejada e do tipo de conversão prevista para o trecho mogiano da Linha 11, como já expusemos no passado, seria possível pensar na convivência entre trens pesados e bondes modernos.
Acrescentando vias auxiliares e desvios (ou bypasses, em inglês) para permitir viagens expressas à Linha Safira, permitir-se-ia a circulação de trens-duais entre as linhas 11 e 12. Um exemplo de serviço possível poderia conectar Brás e Estudantes, obedecendo parada em poucas estações-chave ao longo do trajeto (como Engenheiro Goulart e São Miguel Paulista, por exemplo). O trem entraria na Linha 11-Coral a partir de Suzano e terminaria na Estação Estudantes ou, mais provavelmente, na Estação Mogi das Cruzes, que possui plataformas terminais subutilizadas.
Finalmente, vale ainda lembrar que VLTs podem realizar o chamado streetrunning, em que, com trilhos assentados em vias de tráfego misto ou compartilhadas com modos ativos, o bonde circula dentro da cidade, diferindo-se de um trem pesado, que apenas passa por uma ou mais estações estratégicas, uma vez que não convive facilmente com pedestres, ciclistas e automóveis. Seria perfeitamente possível, num cenário de conversão de todo o trecho mogiano, imaginar um serviço circular atrelado à Estação Mogi das Cruzes, trafegando em porções estratégicas do Centro Histórico e Tradicional. Outra estratégia interessante, aliada a CEPACs e à forte ocupação da face norte da Estação Estudantes, seria a construção de uma linha anelar de peoplemover, fisicamente integrada e que poderia utilizar um trem com tecnologia nacional da Aeromóvel.
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