Por Caio César | 12/04/2023 | 8 min.
Índice
Introdução
Na última terça-feira, 11, uma audiência pública história foi realizada na Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (Alesp). Convocada pelo Sindicato dos Metroviários e Metroviárias, a audiência contou com a participação de mandatos de oposição, representantes sindicais dos diferentes sindicatos que representam a classe ferroviária e foi mediada pela codeputada Sirlene Maciel da Bancada Feminista do Partido Socialismo e Liberdade (PSOL). A abertura foi realizada pela codeputada Paula, também da Bancada Feminista.
Entre os mandatos do Legislativo estadual presentes, identificamos: Simão Pedro (PT), Leci Brandão (PCdoB), Guilherme Cortez (PSOL) e Carlos Giannazi (PSOL). Estiveram presentes outras presenças ilustres do cenário político, como Vera Lúcia (PSTU) e Professor Toninho Vespoli (PSOL), este último vereador da Câmara Municipal de São Paulo.
Nota do autor: confesso que, passados dez anos à frente do Coletivo, fiquei surpreso com as proporções da audiência, que lotou o pequeno auditório Teotônio Vilela, além de ter acompanhada ao vivo por pouco mais de 100 pessoas. Pode não parecer muito, mas considerando outras tentativas do Comitê de Luta Contra a Privatização da CPTM, a audiência foi um sucesso. A presença dos representantes dos diferentes sindicatos, sentados na mesma mesa, ao lado da presidenta Camila Lisboa do Sindicato dos Metroviários e Metroviárias, por exemplo, constitui um importante marco na luta contra a privatização dos trens metropolitanos, da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos e da Companhia do Metropolitano de São Paulo (METRÔ, normalmente grafada como Metrô).
Monotrilho
Uma das infraestruturas de transporte que suscitou a realização da audiência foi a Linha 15-Prata (Vila Prudente-Jardim Colonial), que utiliza uma solução de monotrilho de alta capacidade, originalmente desenvolvida pela Bombardier Transportation (adquirida pela concorrente Alstom em janeiro de 2021).
Ao longo da audiência, dois metroviários fizeram falas denunciando a fragilidade do sistema de sinalização e controle de trens da Linha 15, denunciando que este não conta com o equivalente ao ATP (Automatic Train Protection ou proteção automática de trem), responsável por oferecer redundância e um ambiente de falha segura, impedindo colisões, como as duas últimas, ocorridas em 08/03/2023 e 09/03/2023.
O monotrilho foi alvo de preocupação por parte do vereador Toninho Vespoli, que revelou ser morador de uma das cercanias atendidas pela linha e que o arranjo de concessão da Linha 15 expõe uma negociata. Para o parlamentar, é preciso disputar a grande mídia, de forma a angariar apoio na luta contra as privatizações.
Discordamos, entretanto, a posição de Albertino (conselheiro e gestor da saúde da supervisão técnica de Vila Prudente e Sapopemba) que sustentou que “uma capital” vive na porção prevista para ser atendida pela Linha 15-Prata, defendendo a implantação de uma linha de metrô pesado ferroviário convencional. Para ele, o monotrilho é incapaz de resolver a situação da região.
É preciso deixar claro ao senhor Albertino que o monotrilho jamais foi colocado como uma solução única para resolver um problema que não tem solução fácil e rápida. O desenvolvimento da Linha 14-Ônix (atualmente Bonsucesso-Jardim Irene), prevista como articulação perimetral da periferia expandida no vetor leste, exemplifica este fato, bem como projetos que pouco ou nada evoluíram, como o Corredor Metropolitano Perimetral Leste (que realizaria o trajeto entre o Terminal Cecap e a Estação Dom Bosco por meio da av. Jacu Pêssego).
A implantação de metrô pesado exige mais tempo e dinheiro. A expansão da Linha 2-Verde (Vila Prudente-Vila Madalena) em direção a Guarulhos é didática: a expectativa de sua expansão até a região Penha é tão ou mais antiga do que o projeto e construção da Linha 15-Prata, no entanto, enquanto a Linha 15 está sendo expandida para a região da Jacu Pêssego, as novas estações da Linha 2 seguem em construção.
Com a gravidade do uso e ocupação do solo não só na capital, mas na região metropolitana, a tecnologia monotrilho é uma aliada da população. Os problemas da Linha 15-Prata exigem investigações sérias, do contrário, funcionários continuarão servindo como “bucha de canhão”, enquanto a credibilidade da operação é arranhada junto à população, que não pode se sentir, como corretamente denunciou Albertino, insegura ou receosa ao embarcar nos trens da Linha 15.
Trem Metropolitano
Destacamos a presença de dois passageiros, entre eles, o passageiro responsável pelos perfis da Via’I’Mobilidade no Twitter e Instagram. As denúncias giraram em torno da superlotação, agravada pela dificuldade de cumprimento dos intervalos médios que eram praticados pela CPTM, incluindo denúncias de falhas em portas e recolhimento de trens no horário de pico; e desconforto, agravado por problemas nos condicionadores de ar dos trens, incluindo a denúncia de que a ViaMobilidade preteriria a manutenção destes devido ao suposto custo elevado.
Até mesmo os pantógrafos não escaparam dos olhares atentos de Gabriel Prates, que tem flagrado a utilização de lacres para travá-los, além da ausência de maçanetas nas portas entre carros, inoperância de visores (normalmente utilizados para exibição de data e hora, estação e lado de desembarque) e mapas dinâmicos com funcionamento errático. Para Prates, uma vistoria técnica precisa ser realizada.
O Comitê de Luta Contra A Privatização da CPTM também destacou falas de Dametto, Sismacer, Davi e Vitor em seu perfil no Twitter.
— Comitê de Luta Contra A Privatização da CPTM (@comitecptm23) April 12, 2023
Problemas estruturais de cunho socioeconômico
A exposição feita pela senhora Maria Lourdes Brito ficou um pouco confusa, mas se entendemos bem, envolve uma ocupação em algum ponto da Linha 8-Diamante (Júlio Prestes-Itapevi-Amador Bueno). A denúncia de Brito envolveu sérios problemas de drenagem após a queda e reconstrução de um muro. Embora tenhamos identificado que, em 10/03/2023, segundo veículos como o Diário do Transporte, houve a queda de um muro na região da Estação Júlio Prestes, dado o teor do relato, o problema parece estar no trecho da Linha 8 que atravessa o município Carapicuíba, e envolve não apenas a ViaMobilidade, mas também a Sabesp, que suspendeu o fornecimento de água após uma ação de reintegração de posse.
Conforme reportagem da TV Osasco de 15/03/2023, a inundação na região central da cidade foi severa.
Como adiantado pelo COMMU em artigo de 12/07/2019, “Concessão de duas das mais promissoras linhas da CPTM amesquinha potencial existente”,
Um governo que constrói uma imagem de parceiro do empresariado e da iniciativa privada não pode conceder um ativo tão estratégico a troco de nada. É preciso, além da exploração imobiliária, garantir a solução de problemas sociais que se estabeleceram ao longo das linhas, notadamente em pontos críticos da Linha 8-Diamante que cortam os municípios de São Paulo, Osasco e Carapicuíba. Existem, pelo menos, três assentamentos precários que precisam de conversão em moradia digna e com diversidade de rendas e equipamentos, um deles às margens da poluída lagoa de Carapicuíba.
Similarmente, adiantamos, entre outros aspectos preocupantes da concessão, em artigo de 03/03/2020, “Contra privataria, COMMU se reúne com representante do deputado Carlos Giannazi”,
Incertezas em relação a problemas sociais de longa data, tais como assentamentos precários ao longo da Linha 8-Diamante, como as favelas do Moinho, Porto de Areia e da Estação Santa Terezinha;
A Bancada Feminista se comprometeu durante a audiência a buscar ajudar acolher as demandas da senhora Maria. Esperamos que o desfecho seja positivo e que todas as pessoas afetadas possam gozar de moradias verdadeiramente dignas e salubres no futuro.
Conclusão
Em linhas gerais, a maioria das falas denunciou a postura de precarização do serviço público e hostilização do funcionalismo público. Para o representante do Sindicato dos Ferroviários da Zona Sorocabana, a postura do atual governo não é novidade, recordando a escassez de materiais quando do processo de extinção da Ferrovia Paulista S. A. (Fepasa), que foi incorporada à Rede Ferroviária Federal S. A. (RFFSA), em processo de desestatização durante o governo de Fernando Henrique Cardoso (PSDB).
Funcionários e representantes sindicais alertaram que, se necessário, farão greves como forma de oposição à senha privatista da atual gestão do Executivo, encabeçada por Tarcísio de Freitas (Republicanos), que possui maioria na Assembleia Legislativa, tendo, portanto, facilidade para movimentar os tentáculos do bolsonarismo em território paulista.
O COMMU reitera que a greve é um direito trabalhista e que a classe trabalhadora, em sua maioria, alijada de representações sindicais funcionais e com baixa capacidade de reivindicação, não deve transformar em vilãs as categorias grevistas, sejam elas quais forem.
A audiência buscou reiteradamente alertar sobre a expansão do “padrão ViaMobilidade” para todas as linhas do sistema, precarizando a vida de milhões de pessoas. Durante as falas, a situação da SuperVia, concessionária da malha da Companhia Estadual de Engenharia de Transportes e Logística (CENTRAL), foi lembrada. Desde fevereiro deste ano, sem a utilização do Bilhete Único Intermunicipal, o passageiro precisa pagar R$ 7,40 (caso utilize o bilhete, a tarifa é de R$ 5).
Finalmente, esperamos que mais audiências e mobilizações sejam realizadas. Entre os encaminhamentos, está a elaboração de uma cartilha, a ser distribuída para fins de conscientização da população. A realização de um plebiscito também foi apontada como uma possível saída, no entanto, em conversa com Rafael Calabria do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), que também esteve presente e fez uma fala nos primeiros minutos da audiência, o COMMU foi informado de que a proposta requereria apoio da base de apoio da gestão Tarcísio, sendo bastante improvável.
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