Subsídio às montadoras impulsiona narrativas abjetas no Twitter

Por Caio César | 28/05/2023 | 4 min.

Legenda: Bairro Pinheirinho em São José dos Campos, visto a partir de um ônibus na rodovia SP-070, típico exemplo de periferia com desenho carrocentrado
Reacionarismo domina discursos e insistência na figura do “pobre hipotético” tenta escamotear péssima política do terceiro governo de Lula (PT)

Antes que qualquer um de nós conseguisse compreender profundamente as mudanças propostas para o plano diretor paulistano, o anúncio de uma política federal de incentivo a automóveis precificados em até R$ 120 mil, passou a bombardear nossas linhas do tempo na rede social do canário mimado.

Apoiadores — e até mesmo alguns opositores! — do governo Lula passaram a defender a posse do automóvel, construindo espantalhos e generalizando situações pontuais para todo o Brasil. Além disso, o esgarçamento da heterogeneidade da ocupação brasileira, bem como um desprezo performático pela macrorregião Sudeste, contribuíram para a propagação de discursos bastante desonestos. Houve até quem reduzisse a importância do protagonismo da União para o desenvolvimento de nossas cidades, infraestruturas de circulação e sistemas de transporte público, automaticamente negligenciando marcos regulatórios relevantes, como o Estatuto da Cidade e o Estatuto da Metrópole.

Novamente, a população de baixa renda foi tokenizada das mais diferentes maneiras. Tantas, que é até difícil escrever este artigo de opinião. Foi fácil perder a conta do volume de absurdos despejados no Twitter. Todos aqueles que poderiam ser considerados, independente do critério, pobres, foram reduzidos a uma massa amorfa, torturada discursivamente conforme a conveniência do narrador de plantão.

Aqueles minimamente críticos foram acusados de serem proprietários de automóveis de luxo e de tecerem críticas a partir de salas com ar-condicionado, com o único objetivo de enfraquecer o governo Lula e preservar privilégios. Mais uma vez, reinou a ideia de que o transporte público é irremediável e que apenas gente coitada e sem opção se submeteria a utilizá-lo.

Legenda: Exemplos de publicações no Twitter que, ao contrariem a política, se tornaram um ímã de comentários canalhas

Nós do COMMU assistimos atônicos ao fato de o automóvel estar sendo, mais uma vez, alçado ao posto de baluarte da vida adulta. Nada mais falso. Nada mais desonesto. Nada mais asqueroso. Nada mais lamentável.

Desde 2014, este Coletivo pauta a mobilidade na RMSP (Região Metropolitana de São Paulo), pincelando, por vezes, a mobilidade em toda a MMP (Macrometrópole Paulista, uma proto-megalópole que combina múltiplas regiões metropolitanas paulistas, concentrando aproximadamente 30 milhões de pessoas). Todas as agressões que presenciamos ao longo de uma década tiveram o automóvel em seu cerne. Não está sendo diferente agora.

Legenda: Macrometrópole Paulista em 2015. Clique no mapa para ampliá-lo. Mapa elaborado pela extinta Emplasa no âmbito do Plano de Ação da Macrometrópole 2013-2040 e obtido em apresentação ligada ao estado fluminense

Argumentos abjetos não mudarão nossa configuração populacional, nem as crueldades cristalizadas ao longo de décadas. O Brasil extinguiu trens e bondes, abusou da capacidade de ônibus e marginalizou bicicletas, tudo enquanto expandia sua malha rodoviária e normalizava a construção de bairros com estrutura e relações funcionais inspiradas em subúrbios estadunidenses.




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