São Paulo não está inchada! Por um Centro Expandido denso e acolhedor

Por Caio César | 11/11/2024 | 4 min.

Legenda: Parte do entorno da Estação Alto do Ipiranga reforça como São Paulo tem sérios problemas para apresentar uso e ocupação do solo condizentes com a infraestrutura instalada
Não é utopia lutar pelo direito de residir no mesmo bairro no qual existem vínculos de trabalho, de estudo e de saúde

No último domingo, 10, o Movimento Salve a Sena Madureira, bem como outros grupos ativistas, organizaram uma concentração na região da Praça Lasar Segall. Nosso membro e morador da região, Lucian De Paula, esteve presente e fez uma fala importantíssima sobre direito à moradia.


Legenda: Fala de Lucian De Paula, conforme publicação no Instagram

Não é utopia lutar pelo direito de residir no mesmo bairro no qual existem vínculos de trabalho, de estudo e de saúde. Para não ficar no óbvio, há moradores das comunidades afetadas que não só trabalham ou estudam na Vila Mariana, mas também fazem tratamentos médicos ou desenvolvem atividades de cunho artístico-cultural que poderiam ser mais difíceis ou mesmo impossíveis a dezenas de km de distâncias.

Como já pontuado em outros artigos sobre o túnel higienista e de capacidade irrisória, a questão das famílias em condição de insegurança habitacional, passando atualmente por um verdadeiro terror psicológico com o risco iminente de expulsão, é extremamente central para o Coletivo, que ao longo de uma década, orientou inúmeras discussões a partir do transporte de alta capacidade.

Acumulamos mais de uma centena de artigos falando sobre o transporte sobre trilhos, principalmente aquele operado pela CPTM (Companhia Paulista de Trens Metropolitanos), porque a dependência deste é uma realidade difícil de evitar e compartilhada por milhões de habitantes, não só da capital, mas da região metropolitana. Realidade que não se limita às imagens de estações lotadas que permeiam uma imprensa nem sempre interessada em reportagens aprofundadas, mas que está diretamente ligado à paisagem da cidade e suas disputas socioeconômicas.

A intransigência do prefeito Ricardo Nunes (MDB), que tentou deslegitimar e resumir as manifestações de domingo a mero teatro, é, sem dúvidas, revoltante. Os registros de árvores sendo derrubadas e (pasme!) concretadas, chocam, entristecem e enraivecem, mas não podem estimular comentários neomalthusianos, sugerindo que a população paulistana é “grande demais” ou que atingimos níveis alarmantes de “saturação da cidade”.

Não quero aqui vomitar mais dados ou confeccionar mais mapas sobre densidade demográfica. Estou farto de dizer o mesmo, dia após dia, seja escrevendo artigos que consomem meu bem mais precioso (tempo), seja respondendo a comentários em redes sociais insalubres.

Tentarei ser objetivo: São Paulo precisa buscar uma melhor distribuição populacional urgentemente. Só assim preservaremos e ampliaremos não só a arborização em nossos tecidos mais urbanos e centrais, mas também evitaremos o desmatamento em massa nas periferias e subúrbios, longe dos olhares da maioria dos ativistas e também do Estado.

O túnel que ameaça a Sena Madureira não é sintoma de uma “cidade inchada” ou “saturada”, mas de uma cidade que se espalhou orientada por um urbanismo distorcido pela idealização do automóvel como principal ferramenta de acesso. Não só a Vila Mariana, mas o Centro Expandido inteiro, incluindo os enfadonhos bairros de mansões, como Jardim Europa, Jardim América e Alto de Pinheiros, entre outros, precisam abrigar muito mais pessoas.

Se há algo a ser repetido, é que não existe metrô milagroso e, quanto mais estimularmos a urbanização difusa, mais difícil será deter processos que ampliam e alargam o sistema viário.

Defender o “congelamento da população” não é correto e constitui uma verdadeira antessala para um fascismo que, sob um verniz pretensamente ambiental, ameaçaria populações inteiras. Para uma cidade mais verde e inclusiva, vamos precisar encarar alguns fantasmas persistentes, como o fetiche em torno de “casas maravilhosas” ou “predinhos charmosos”. Vai ser difícil, eu sei, mas não há outro caminho.

Enquanto escrevo, frações comparáveis a uma parte do parque do Ibirapuera serão desmatadas a cerca de 30 km pelo mercado formal, enquanto outros quantos hectares já foram ou estão sendo perdidos com loteamentos informais de péssima qualidade, dentro e fora da capital — para não lembrar dos condomínios que importaram o pior dos Estados Unidos para regiões metropolitanas vizinhas, como as de Campinas e de Sorocaba.

Se há demanda habitacional, não adianta escrever com rompantes de fúria, como se fosse razoável exterminá-la ou como se pudesse desaparecer. Acolher é o caminho e São Paulo pode abrigar milhões de pessoas no Centro Expandido, com muita arborização, extensa malha cicloviária e excelente transporte público. Parece utopia porque somos capturados pelos pesadelos de uma cidade desigual e cruel, quando deveríamos sonhar e buscar uma cidade justa e gentil.




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