Por Caio César | 25/11/2024 | 4 min.
A CPTM (Companhia Paulista de Trens Metropolitanos) nasceu originalmente com a missão de maquiar a precariedade das linhas e entregá-las à iniciativa privada. O plano era ridículo, mas deixou bons frutos com o Integração Centro, responsável por transformar as estações Luz e Brás, além de promover outras intervenções menos visíveis.
Ao contrário do que alguns podem estar pensando, o Integração Centro se arrastou por mais de duas décadas e envolveu o Banco Mundial, que forneceu não apenas o empréstimo, mas também a doutrina econômica e política para a empreitada. A empresa Maubertec, responsável pelo projeto básico envolvendo estudos de traçados e projetos geométricos, torna pública sua participação num trabalho que consumiu, ainda em dezembro de 1993, Cr$ 19.962.467,70, antes do Plano Real, portanto.
A ameaça de desmonte em meados dos anos 2000, seguindo os passos que levaram ao surgimento da SuperVia no Rio de Janeiro, previa uma operação incrivelmente subdimensionada, na qual trens de quatro carros compartilhariam o trecho central da malha, criando uma linha virtual, a Linha I, cuja regulação a CPTM faria.
Provavelmente, com a inauguração do Expresso Leste em 27 de maio de 2000, encerrando a novela protagonizada pelo revanchismo da Rede Ferroviária Federal (RFFSA) quando a prefeitura da capital ainda estava responsável pela Companhia do Metropolitano de São Paulo (METRÔ), o modelo se mostrou equivocado. Os oito carros do Expresso Leste lotavam. E continuam lotando, mesmo com intervalos de quatro minutos e muita maestria de maquinistas e controladores — coisa que a ViaMobilidade parece não saber fazer nas linhas que abocanhou.
Após sapatear com o Banco Mundial, a privatização ficaria reduzida a um serviço de trem seletivo e expresso para Cumbica, supostamente inviabilizado pelo vaporoso trem de alta velocidade até o Rio de Janeiro, politicamente sabotado por nomes como José Serra, embora a incapacidade do Planalto seja histórica, quase como uma maldição pelo desmonte da malha ferroviária federal, que terminou dilapidada e sequestrada por negócios extrativistas.
O carro da fotografia acima, em que pese as iniciativas de inovação que criam um simulacro de estatal moderninha numa batalha com poucas chances de vitória, é um sobrevivente do período mais sombrio da empresa, revertido quando os tucanos de diferentes épocas, sabe-se lá por quais motivos, preservaram uma gota de social-democracia.
O que podemos afirmar sem especulações é que, após 45 milhões de dólares emprestados e quase duas décadas depois, o Banco Mundial terminou aventando uma concessão conjunta das linhas 9-Esmeralda (atualmente Osasco-Mendes·Vila Natal) e 4-Amarela (atualmente Luz-Vila Sônia), concluindo que “concessioning will happen when there is bold political leadership” (algo como “a concessão acontecerá quando houver uma liderança política ousada”, em tradução livre para o português). A conclusão completa, que educadamente chama os tucanos de covardes, minimiza a concessão como um dos objetivos daquele empréstimo e se contenta com o aumento da contratação de serviços específicos pela CPTM, pode ser lida na página 21 do relatório “Brazil - Integrated Urban Transport Project (English)”.
Em suma, o que sobrou da CPTM, que há muito já funciona como um balcão de negócios, deveria suscitar muito mais revolta. O governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) não está simplesmente privatizando uma rede que faz papel de metrô sem que quase ninguém se dê conta ou aceite pacificamente, mas detonando uma política de bem-estar.
Este artigo foi originalmente publicado em 19 de novembro de 2024 no Instagram do Coletivo, tendo sido escrito entre as estações São Caetano do Sul e Brás. Esta é uma versão revisada e ampliada.
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