Contra privatizações, COMMU colabora com vereador da capital

Por Caio César | 13/03/2025 | 9 min.

Legenda: Logotipo do COMMU
Seminário contra a privatização da CPTM, EFCJ e METRÔ acontece hoje, 13 de março. Consultados pela assessoria de imprensa do mandato de João Ananias (PT), oferecemos algumas contribuições em torno de aspectos preocupantes. Confira

Índice


Contextualização

Na segunda-feira, 10, o Coletivo foi contatado por Natália Araújo, assessora de imprensa do mandato do vereador paulistano João Ananias (PT). Fomos informados de que o mandato está comprometido com pautas ligadas ao transporte público em virtude da origem de Ananias (Itaim Paulista, Zona Leste da capital). Segundo Araújo, o vereador foi convidado a participar da mesa do seminário contra as privatizações ligadas às três estatais do transporte sobre trilhos. A interlocução em nome da entidade foi feita por mim, Caio César.


Legenda: Divulgação do seminário, realizada pelo Plamurb no Instagram

Para a assessora de imprensa, em se tratando das privatizações da CPTM (Companhia Paulista de Trens Metropolitanos) e do METRÔ (Companhia do Metropolitano de São Paulo), há escassez de informações envolvendo o antes e o depois, sendo o site deste coletivo um exemplo de fonte com informações coerentes.

Em termos de recomendações gerais, apontamos que, no caso do Itaim Paulista, é fundamental a familiarização com o teor da PPP (parceria público-privada) envolvendo o chamado Lote Alto Tietê, que abrange três linhas do Trem Metropolitano.

Salientamos ainda que, no caso da atuação legislativa do PT (Partido dos Trabalhadores), consideramos que o deputado estadual o Antonio Donato tem feito boas falas, mas que achamos que o partido está se colocando numa posição difícil com o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) no governo federal. Resumidamente, nossa posição é a de que o atual governador, Tarcísio de Freitas (Republicanos), só faz o que faz porque o BNDES é basicamente o avalista da operação de cada PPP.

À assessora, explicamos que o atual quadro é muito decepcionante para nós, exemplificando que um projeto como o do trem para Campinas, celebrado pelo PT em campanha televisiva, é uma violenta agressão às periferias pobres da Sub-região Noroeste da RMSP (Região Metropolitano de São Paulo), na qual, inclusive, sabemos que há a presença do deputado estadual Maurici em termos de nome da esquerda e do petismo.


Recomendações

Foram gentilmente oferecidos os seguintes direcionamentos em nome do COMMU, transcritos a seguir tal qual foram enviados à assessora de imprensa, exceto pela adição dos significados das siglas, recomposição dos parágrafos e adição de complementos entre colchetes:

Para começar, é fundamental que vocês questionem a efetiva capacidade dos instrumentos contratuais defendidos pela SPI (Secretaria de Parceria sem Investimentos; grafia deliberadamente incorreta). Atualmente, nós temos duas linhas concedidas no modelo pré-fortalecimento da SPI. O diretor da ViaMobilidade, que já foi da CPTM, admitiu na frente do Donato que a empresa busca arbitrar todas as multas. Isso esvazia qualquer instrumento que seja fortalecido por medidas punitivas/econômicas, porque o prazo real é o prazo do contrato + arbítrio. Similarmente, o mesmo vale para as multas. A punição real é aquela arbitrada, o que significa que a concessionária pode ganhar tempo e tentar minimizar o impacto.

Por que os contratos funcionarão como dizem que funcionarão? Se não existir uma modelagem pública que estresse os instrumentos de defesa da concessionária, não temos como dar crédito às promessas da SPI.

Outro aspecto é a reforma da estrutura de gerenciamento dos serviços de mobilidade do estado. A EMTU (Empresa Metropolitana de Transportes Urbanos de São Paulo) será extinta e a ARTESP (Agência de Transporte do Estado de São Paulo) será fortalecida. Não sabemos como será feito e, nos serviços de transporte coletivo regulados pela ARTESP, a presença do estado é mínima. Nas linhas de ônibus reguladas pela ARTESP, não tem padrão de nada. Não tem padrão de pintura, não tem plataforma unificada para consulta de horários e itinerários (raramente é possível saber o itinerário, aliás), não tem padrão de bilhetagem.

Por que a ARTESP fará melhor com as linhas concedidas do sistema de trilhos? Qual a real capacidade dela de tocar essa governança?

Depois, temos a questão dos investimentos. Se você pegar veículos como o Metrô CPTM (um blog especializado), vai perceber que as obrigações mudam, com o ressarcimento ou subvenção a depender do escopo alterado. Isso torna o acompanhamento e o manejo das expectativas muito difícil. Na prática, nós temos um "pacote fechado" que passa por poucas audiências e depois são feitas alterações picadas. A flexibilidade é compreensível em virtude da expansão da malha, mas o escrutínio é impossível da forma que está. Esse é outro problema que precisa ser endereçado: a fragilização e a fragmentação institucional, com a perda de transparência e o aumento da complexidade do escrutínio da coisa pública concedida.

Finalmente, temos os investimentos. Nos próximos dois lotes da vez (Alto Tietê e Guarulhos-ABC), não estamos satisfeitos com o contingenciamento, ou seja, investimentos que são desejados e planejados, mas não são realmente previstos ou garantidos pelo contrato celebrado. Isso cria mais um buraco em termos de expectativa e abre uma brecha para desresponsabilizar o estado.

A futura Linha 14-Ônix da CPTM (Companhia Paulista de Trens Metropolitanos) terá impressionantes 32 km (10 km a mais do que a Linha 3-Vermelha, que parte das estações Palmeiras·Barra Funda e Corinthians·Itaquera) e tem motivado preocupações quanto a seu desempenho e capacidade: a adoção de bitola internacional e a opção por trens mais leves, cujos detalhes nunca foram verdadeiramente revelados ao público, se traduzem em perda de capacidade potencial e impossibilidade de interoperabilidade com a Linha 10-Turquesa (Brás-Rio Grande da Serra, futuramente Bom Retiro-Rio Grande da Serra), que também será concedida em conjunto com a 14-Ônix — projeto conhecido como Lote ABC Guarulhos.

Não estamos satisfeitos com o contingenciamento em relação à Linha 13. Ela está interferindo nas linhas 11 e (principalmente) 12 para oferecer um serviço expresso para o aeroporto, feito às custas da maioria que viaja nos trens regulares. Com a concessão, no mínimo, esperávamos maior capitalização para a expansão completa da Linha 13, até [a Estação] Chácara Klabin, eliminando a gambiarra expressa criada pela trupe de João Dória.

Já no caso do [Grande] ABC, além das estações dos centros da cidade serem reformadas, quando deveriam ser reconstruídas pelo volume de pessoas e importância em escala local, metropolitana e regional, estamos achando muito preocupante a implantação de uma linha perimetral de mais de 30 km utilizando bondes modernos de piso baixo, com vários trechos em elevado.

Primeiro, porque a leveza do material rodante não parece condizente com a escala do deslocamento; segundo, porque vários dos trechos são elevados e tememos muito impacto para pouca capacidade; terceiro, porque limitará a interoperabilidade; e quarto, porque da forma como está posto nos anexos, será um serviço parador bem lento (>1 hora de percurso ponta a ponta).

Finalmente, é um equívoco que o governo continue estressando a faixa de domínio centenária que abriga as linhas da CPTM, tentando economizar (redução de capex; capital expenditure ou investimentos em bens de capitais, em tradução livre do inglês para o português) para facilitar a assinatura de contratos. Essas faixas de domínio deveriam ser usadas em prol do Trem Metropolitano, que carece de bons pátios e não possui serviços expressos. Estamos indo na contramão do que fez Paris com a RER (Réseau Express Régional d'Île-de-France ou Rede Expressa Regional da Ilha de França, em tradução livre do francês para o português) ou do que está fazendo o Reino Unido com o Crossrail (que virou a Elizabeth Line mais recentemente).

Contextualização Recentemente, duas notícias preocupantes foram publicadas pelo site Metrô CPTM: a primeira delas, voltada para o futuro TIC (Trem Intercidades) para Campinas, aponta que o governo deve descartar a necessidade de construção de pátios de manutenção pela iniciativa privada, aumentando a pressão sobre os pátios da CPTM (Companhia Paulista de Trens Metropolitanos); já a segunda notícia aponta uma curiosa mudança de planos, na qual o TIC para São José dos Campos seguiria pelo leito da Linha 11-Coral (Luz-Estudantes), a mais movimentada da CPTM, até desenvolver um traçado segregado em Mogi das Cruzes, supostamente utilizando a Variante do Parateí para chegar até a Estação São José dos Campos.

Grandes metrópoles precisam de sistemas híbridos de metrô. Metrôs regionais. Compreendemos a colisão entre a demanda do interior e a demanda da Grande São Paulo, mas acreditamos que o caminho deveria ser transformar a CPTM em algo mais parecido com a RER e oferecer serviços regionais de maior desempenho usando as faixas de domínio das rodovias, que são muito mais novas. Ao fazê-lo, a região metropolitana não perde a possibilidade de implantação de mais serviços, podendo, finalmente, oferecer mais viagens expressas (hoje nós só temos uma grande gambiarra na Linha 13, uma pequena gambiarra na Linha 10 e outro expresso verdadeiro na Linha 11).

Eu sugeriria a avaliação dos pontos acima para estruturar a contribuição do mandatário.


Conclusão

Mais uma vez, encaramos os desafios do progressismo em meio às contradições que surgem entre diferentes esferas governamentais. Há espaço para maior protagonismo do campo progressista, caso atores bem posicionados reforcem o escrutínio sobre instrumentos contratuais, instrumentos regulatórios (ou desenho institucional), investimentos previstos, entre outros aspectos da modelagem da desestatização. A ausência de uma oposição contundente e o vácuo deixado ao longo de mais uma década, infelizmente, ampliaram imensamente a dificuldade de barrar as privatizações que são, basicamente, produto de uma aliança entre os governos estadual e federal.

Em sua recente visita ao Alto Tietê, o atual governador do estado, Tarcísio de Freitas (Republicanos), deixou clara a chantagem que se tornou regra em seu mandato: para ele, a discussão dos pedágios em rodovias que passam por solo mogiano não só está superada, mas faz parte de um modelo inevitável. O governador bolsonarista considera que o pedágio é um pilar inegociável da concessão almejada, que, por sua vez, é a única maneira de viabilizar a retirada de recursos do erário.

Ainda que num momento pouco feliz, o choque entre as escalas regional e metropolitana, bem como os desafios de governança metropolitana, abrem uma trincheira importante para estabelecer frentes de pressão capazes de desafiar a popularidade do atual governador, a qual seguiu estável entre dezembro de 2024 e fevereiro de 2025 — lamentável, mas nada surpreendente.

Finalmente, as concessões e investimentos previstos continuam sendo anunciados numa arena com amplo espaço para fortalecimento do Estado, ou seja, mesmo num cenário em que a máquina pública não pudesse retirar recursos do próprio erário para investimentos diretos e/ou contração de empréstimos, haveria espaço para buscar maior garantia de bem-estar. As atuais PPPs em curso são facilitadas pelo escancarado desconhecimento ou desinteresse das forças progressistas mais poderosas, consequentemente, esvaziando o tensionamento do tecido social e político que poderia culminar em grandes debates públicos e aumento da dificuldade para decisões plutocráticas.

Agradecemos Natália Araújo pelo contato e reconhecimento do trabalho que desenvolvemos há mais de uma década.




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